Por que o boicote à Copa faz sentido
POR CLAUDIO WEBER ABRAMO*
O excelente artigo de Oliver Seitz publicado aqui exprime uma crítica aos que argumentam por um boicote à Copa o Mundo de 2014.
Se tal boicote será ou não possível é outro assunto, sobre o qual não me deterei.
Sempre frisando a excelência das informações expostas por Seitz, gostaria de início de fazer dois reparos:
1) Não é fato que, à época da decisão de se abrigar o evento no Brasil, “quase ninguém reclamou, muito pelo contrário”.
Foram muitos os que se posicionaram contrariamente. Podem não ter convencido muita gente, mas os críticos foram numerosos, a começar pelo responsável por este blog.
2) Observa Steiz que protestos contra a Copa teriam tido lugar lá atrás, mas não hoje.
Ué, por que não? Desde quando o fato de não se ter protestado no passado deveria servir de argumento para não se protestar hoje?
Calar-se para sempre?
Se isso devesse servir de norte, o progresso político (e de qualquer tipo, na verdade) seria impossível.
O argumento de Steiz nesse particular é hiperconservador e paralisante.
De todo modo, o que estaria em jogo num boicote à Copa nada tem a ver com o custo já incorrido.
Acho esse argumento particularmente pobre, porque se o custo já rolou, sob esse ponto de vista na verdade tanto faz realizar ou não a Copa.
O fato é que a Copa do Mundo no Brasil virou assunto político.
Não é um assunto meramente econômico (ou melhor, financeiro).
Não adianta dizer que política se faz de outro jeito.
É claro que política se faz de uma porção de jeitos, incluindo-se protestar contra a realização da Copa do Mundo e usar o verdadeiro descalabro que é fazê-la no Brasil, e nas condições em que se fará (estádios etc. pagos com dinheiro público), como exemplo da inépcia e irresponsabilidade dos diversos governantes responsáveis.
Afirmar, como Steiz faz, que a manifestação política que de fato vale se dá nas eleições é uma meia-verdade.
É fato que eleições representam a cristalização da manifestação política.
Mas não é de modo algum verdadeiro que seja a única forma de manifestar-se politicamente.
Seu argumento é outra vez hiperconservador: não saia às ruas, não proteste, apenas vote (nas pessoas que a cartolagem partidária definiu).
A presidente da República e seus conselheiross se deram conta do caráter fundamentalmente político do assunto “Copa do Mundo”.
Primeiro, dedicou parte do seu pronunciamento ao tema, o que à primeira vista pareceria até mesmo bizarro.
Que raio de importância tem Copa do Mundo na ordem das coisas?
Segundo, mobilizou as Forças Armadas para proteger a realização da final da Copa das Confederações.
O Exército na rua para proteger jogo de futebol?
Copa virou assunto de segurança nacional.
Se isso não é política, o que mais seria? Espero que não se alimentem dúvidas a
respeito das motivações presidenciais, idênticas às de prefeitos e governadores comprometidos com a mesma coisa.
Sabem todos eles que um recuo em relação à Copa resultaria em imenso desgaste político.
É claro que estão pouco se lixando para a Copa em si, a hotelaria e quejandos; o que lhes interessa é a sua própria imagem, ou seja, assunto só político.
O que se deve indagar de Steiz é, então: por que é lícito aos governantes usar politicamente a Copa do Mundo mas não seria admissível a manifestantes de rua fazer o mesmo? —
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*Claudio Weber Abramo é Diretor executivo da Transparência Brasil.
Origem : BLOGDOJUCA
Autor : Juca Kfouri