Diretoria do clube baiano pede restituição de valores que teriam sido gastos indevidamente por Marcelo Guimarães Filho, deposto do cargo em julho de 2013

A relação entre o Bahia e o antigo presidente do clube Marcelo Guimarães Filho está longe de acabar. No começo deste mês, a atual diretoria da equipe entrou com uma ação de perdas e danos contra o dirigente deposto pela justiça em julho de 2013 . No processo, que corre na 1ª Vara Cível de Salvador, o Bahia cobra R$ 44.737.010,14 de MGF.
O documento obtido pelo GloboEsporte.com aponta possíveis irregularidades na administração do clube. Entre os pontos citados, estão a negociação do Fazendo e a Cidade Tricolor, processos no Ministério do Trabalho, notas fiscais sem comprovação de serviço e valores que teriam sido retirados indevidamente e sem justificativa apresentada.

A petição inicial lembra que já foi instaurada uma ação pelo Ministério Público do Estado da Bahia, por supostos desvios administrativos, processo ainda na fase de instrução, contra a antiga diretoria do clube. De acordo com o texto, auditoria feita nas contas do Bahia “descobriu diversos atos administrativos ilegais, inválidos e/ou em transgressões estatutárias absurdas que serão aqui desnudados, atraindo o dever de indenizar, na forma da legislação de regência”.

[caption id="attachment_25609" align="aligncenter" width="690"] Clube cobra do antigo presidente a restituição de valores gastos durante sua gestão (Foto: Reprodução)[/caption]

No pedido, o clube ainda diz que não tem interesse na realização de audiência conciliatória. O documento é repleto de anexos, como imagens da auditoria, depoimentos e trechos do estatuto do clube. São mais de duas mil folhas de documentos.

A certa altura, diz:
- Tais fatos, consubstanciados pela farta documentação aqui anexada, demonstram, na prática, que o Réu tratava o Clube Autor como propriedade familiar, em verdadeira confusão patrimonial.
Em contato com o GloboEsporte.com o ex-presidente disse não ter sido citado sobre o caso e que, por isso, não tem conhecimento sobre a ação. Entretanto, Marcelo Guimarães Filho afirmou que se trata de uma tentativa de desviar o foco dos resultados do clube. O Bahia ocupa a 10ª colocação da Série B do Campeonato Brasileiro com 21 pontos conquistados.

- Não fui citado. Esperar ser citado. Me defender e, fatalmente, confio na Justiça, acho que vou ganhar. Óbvio que é uma clara ação, como sempre aconteceu nestes três anos, de tirar o foco da gestão desastrosa que assumiu o clube desde que eu saí. Deixei o clube na Série A e colocaram na Série B.

Essa gestão de Marcelo Sant’Ana é uma sequência de Schmidt (Fernando Schmidt, ex-presidente do Bahia). Marcelo foi candidato de Schmidt. Pegaram na Série A e estão prestes a levar para a Série C. Essa ação é um absurdo e com o claro intuito de tirar o foco - disse Marcelo Filho em entrevista ao GloboEsporte.com.

Confira abaixo alguns dos tópicos do processo do Esporte Clube Bahia contra o ex-presidente Marcelo Guimarães Filho.

FAZENDÃO X CIDADE TRICOLOR

O primeiro tópico do processo feito pelo Bahia trata da negociação para a construção da Cidade Tricolor. O texto lembra que foi feita uma Assembleia Geral de Sócios que aprovou a permuta do Fazendão com o novo centro de treinamentos. Entretanto, deveria ter sido apresentado um parecer sobre a negociação, que não deveria gerar ônus para o clube.

- Ocorre que, desde o primeiro “PROTOCOLO DE INTENÇÕES E OUTRAS AVENÇAS”, firmado 17/08/2011 e assinado, como representante do clube, apenas pelo ex-presidente, ora réu (o vice-presidente financeiro assina como mera testemunha), não se obedeceu a permuta autorizada pelos sócios, quando se criou, à revelia do que foi aprovado em Assembleia, portanto, definitivamente às escuras, figuras e obrigações distintas e nebulosas, data venia, que trouxeram danos absurdos ao autor - diz o texto.

Por fim, o Bahia pede o ressarcimento dos prejuízos.
- Não resta a menor sombra de dúvidas que o negócio jurídico firmado foi totalmente desvirtuado, gerando à época um prejuízo aos cofres do Clube de R$14.872.047,38 (quatorze milhões, oitocentos e setenta e dois mil e quarenta e sete reais e trinta e oito centavos), que devem ser atualizados para a presente data, conforme CLÁUSULA SEGUNDA, item “DAS ALTERAÇÕES”, itens 2.2 e 2.3, do aditivo de 2013, subscrito pelo réu.

[caption id="attachment_25606" align="alignleft" width="290"] r foi apresentado durante a gestão de Marcelo Guimarães Filho (Foto: Thiago Pereira)[/caption]

AÇÕES NO MINISTÉRIO DO TRABALHO

Em um segundo momento, o texto faz referência às diversas ações impetradas contra o clube na gestão do antigo presidente. Na lista, estão processos que o Bahia sofreu por falta de pagamento do 13º, atraso de salário e, também, pela prorrogação da jornada de trabalho além das duas horas diárias.
- Evidente que tais multas resultaram da atuação desidiosa do réu na condição de Presidente do Clube, que deixou de adotar providências mínimas a fim de fazer cumprir as obrigações trabalhistas inerentes à empresa, pelo que deve responder diretamente pelos prejuízos que causou ao Clube, devendo ser condenado a indenizar quanto aos valores acima identificados - diz o texto.

NOTAS DE DESPESAS NÃO COMPROVADAS OU DE TERCEIROS

Há, ainda, na petição uma relação de gastos que foram feitos pelo clube sem a devida comprovação ou em referência a pessoas que não tinham ligação com o Bahia. Entre os atos praticados, estavam o pagamento de passagens aéreas e hospedagens; notas fiscais, depósitos e transferências de valores por supostas prestações de serviços que não teriam sido reconhecidas ou identificadas, além de empréstimos a terceiros. Segundo levantamento feito pela gestão atual, o montante total desta causa reclamada é de R$ 7.758.749,37, corrigido em 1º de maio deste ano.
Nesta parte, há uma tabela indicando as pessoas e/ou empresas que receberam os recursos com os referidos serviços descritos. Em muitos casos, os citados são familiares de Marcelo Guimarães Filho.

- Foram encontrados cheques bancários com discriminação de empréstimo de terceiros, sem especificação; recibo com discriminação de adiantamento a terceiros referentes a “obra”, sem especificação da obra e do beneficiário; recibo de devolução de adiantamento a terceiros, sem especificação do beneficiário; cheque para o boy do financeiro do clube para sacar o valor de recibos sem especificação, e com previsão de pagamento a terceiros; comprovantes de depósitos bancários sem especificação de beneficiário; comprovante de depósito para o irmão do Réu (Marcos César de Medeiros Guimarães), que não detinha qualquer vínculo trabalhista ou estatutário com o Clube a justificar a transação - diz o texto.
Um nome citado neste quesito é o de Marcelo Guimarães, pai de Marcelo Guimarães Filho e, também, ex-presidente do Bahia.

- Foram encontrados comprovantes de reserva de hotel a pedido do pai do Réu; comprovante de pagamento de guia de recurso ordinário da empresa do pai do Réu (Postdata Serviços e Gestão de Saúde LTDA – consignação de pagamento de processo do próprio Marcelo Guimarães – pai do Réu), custas do referido processo, comprovantes de transações bancárias para a conta do pai do réu, e cheque para o pai do réu, sem qualquer identificação com atividades do Clube.

Além do pai, o clube teria pagos despesas pessoais do dirigente, da esposa, da mãe, do cunhado, além de outros familiares e amigos.
- Foram encontrados boletos pagos pelo clube de taxa para retirada de passaporte do réu e de seu assessor, recibos de devolução de empréstimo para pagamento de despesas diversas, e cópia de cheques, além de passagens aéreas para Marcelo Guimarães Neto e Matheus Guimarães (filhos do réu), sem justificativa para tais custos serem arcados pelo Clube.

REEMBOLSO DE VALORES RETIRADOS INDEVIDAMENTE

O processo ainda expõe e explica uma operação que teria sido realizada pelo clube com uma empresa do pai de Marcelo Guimarães Filho. Em 2000, o Bahia teria contraído um empréstimo de R$ 200 mil junto à empresa Sedil Segurança Ltda, com taxa de juros de 2,5% ao mês. Com o decorrer dos anos, o acréscimo dos juros e os pagamentos subsequentes, o clube teria passado de devedor a credor entre 2010 e 2011.

- Em resumo, a suposta dívida originalmente contraída pelo Clube no valor de R$200.000,00 (duzentos mil reais) teria alcançado o absurdo montante de R$4.047.344,41 (quatro milhões quarenta e sete mil trezentos e quarenta e quatro reais e quarenta e um centavos), sendo que foram contabilizadas operações financeiras sob a rubrica de amortização desta questionável dívida no valor total de R$6.940.408,40 (seis milhões novecentos e quarenta mil quatrocentos e oito reais e quarenta centavos). Algo surreal e que já indica a total ilicitude do procedimento - diz o processo.
"Em 2011 foi retirado do caixa do Autor a quantia de R$1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais), mediante saque de dois cheques do Clube, sendo a quantia repassada ao Sr. Marcos Guimarães, irmão do Réu, sob a justificativa que o montante seria utilizado para saldar débitos fiscais do Sr. Marcos".

Há uma tabela na petição que indica o pagamento e a amortização da suposta dívida. A quitação do empréstimo era feita mediante retiradas de valores diversos dos cofres do clube. Uma delas teria tido caráter extremamente pessoal.
- Em 2011 foi retirado do caixa do Autor a quantia de R$1.500.000,00 (um milhão e quinhentos mil reais), mediante saque de dois cheques do Clube, sendo a quantia repassada ao Sr. Marcos Guimarães, irmão do Réu, sob a justificativa que o montante seria utilizado para saldar débitos fiscais do Sr. Marcos - acrescenta o texto.

De acordo com o processo, estes saques não eram devidamente justificados. Teria ocorrido, então, uma tentativa de utilizar notas fiscais frias para maquiar as contas. Uma delas se referia a um serviço de engenharia no Fazendão. Entretanto, um funcionário do clube em depoimento que foi anexado ao processo, nega tal obra no centro de treinamento.

- Tais fatos, consubstanciados pela farta documentação aqui anexada, demonstram, na prática, que o Réu tratava o Clube Autor como propriedade familiar, em verdadeira confusão patrimonial, utilizando a “desculpa” de um contrato abusivo de empréstimo inclusive com características de agiotagem – firmado com empresa ligada ao seu genitor, quando esse era Presidente do próprio Clube, para movimentar de maneira constante e desordenada quantias verdadeiramente pertencentes à associação autora, exclusivamente para benefício próprio - avalia o texto.

HISTÓRICO

Marcelo Guimarães Filho foi eleito presidente do Bahia em 2008. Ele foi afastado do cargo por ordem judicial em três oportunidades. Em 2011, no dia da eleição que o reelegeu para o cargo, o pleito foi interrompido sob a alegação de irregularidades na formação do conselho deliberativo do clube. Entretanto, o desembargador Gesivaldo Brito anulou a liminar foi concedida pelo juiz Paulo Albiani, da 28ª vara cível de Salvador, durante a madrugada. Marcelo Filho foi reeleito para um mandato de três anos.

Quase três meses depois, a eleição foi suspensa novamente por uma decisão do juiz Paulo Albiani. Carlos Rátis foi nomeado interventor novamente para convocar “eleições para a constituição do Conselho Deliberativo do clube, do Conselho Fiscal e, após isso, para presidente da diretoria para o próximo triênio”, conforme a determinação judicial.

Sem sucesso na empreitada, Carlos Rátis tentou convocar uma audiência para listar os sócios do Bahia. No entanto, antes mesmo disso, o departamento jurídico do clube conseguiu uma liminar para permitir o retorno de Marcelo Filho ao cargo. A decisão provisória foi derrubada em julho de 2013, quando o dirigente foi afastado definitivamente da presidência do Bahia.

Fonte: Ge.com

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