Superfaturamento na Arena Pernambuco se deu na venda do terreno, diz PF

Estádio ainda pode se tornar o mais caro entre os que foram erguidos para a Copa - Reprodução/Facebook

A Polícia Federal suspeita que a negociação de terrenos públicos envolvida no contrato para construção e administração da Arena Pernambuco tenha sido a fonte do superfaturamento do estádio. Segundo o superintendente da PF em Recife, Marcello Diniz, áreas teriam sido repassadas pelo governo de Pernambuco à Odebrecht por um valor abaixo do mercado. Assim, a empresa teria um obtido um ganho além do previsto em contrato.

"O superfaturamento de R$ 42,8 milhões vem da subavaliação dos terrenos", disse Diniz, em entrevista ao UOL Esporte, horas depois de deflagrar a operação Fair Play, que investiga suspeitas de ilegalidades durante a construção da Arena Pernambuco. O estádio fica em São Lourenço da Mata, região metropolitana de Recife. Foi erguido para receber jogos da Copa das Confederações de 2013 e Copa do Mundo de 2014.

"Já fizemos perícias levantando o valor dos terrenos com bases em dados de corretoras de imóveis", explicou superintendente da PF. "A empresa recebeu terrenos por um preço bem menor do que o real."

O valor total da diferença seria R$ 42,8 milhões. Hoje, porém, esse valor já chegaria a R$ 70 milhões, só levando em consideração a correção monetária desde 2010, quando o contrato para construção da Arena Pernambuco foi fechado.

Esse contrato falava também da construção da chamada Cidade da Copa. O espaço seria um grande empreendimento imobiliário que atrairia empresas para São Lourenço da Mata e contribuiria para a viabilização financeira da Arena Pernambuco.

O empreendimento, porém, nunca saiu do papel. Desde 2013, quando a Arena Pernambuco foi inaugurada, sua operação acumula um prejuízo de R$ 24,4 milhões –e pelo menos metade deste valor recai sobre as contas públicas do Estado, graças às cláusulas contratuais que balizam a parceria público-privada entre Pernambuco e Odebrecht.

O delegado Diniz afirmou ao UOL Esporte que a avaliação subestimada de terrenos públicos foi usada ainda para obtenção de financiamentos públicos maiores. Ele explicou que parte da obra da arena deveria ser coberta pelo governo estadual com o repasse dos terrenos à Odebrecht. Como os terrenos foram subvalorizados, financiamentos maiores foram necessários para custear a construção do estádio.

O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e o BNB (Banco do Nordeste) financiaram a construção da Arena Pernambuco. O estádio custou cerca de R$ 800 milhões –esse valor ainda é tema de discordância entre o governo de Pernambuco e a própria Odebrecht, e certamente ainda vai subir muito, porque o governo se compromete a garantir uma lucratividade anual mínima para a empreiteira até o fim do contrato.

Outros estádios

O superintendente da PF afirmou ainda que, a princípio, irregularidades estão sendo investigadas só na Arena Pernambuco. Ele, porém, não descarta que a investigação seja ampliada para outros estádios. "Estamos investigando a Arena Pernambuco, mas pedimos informações sobre outros estádios", afirmou. "Se encontrarmos alguma coisa, vamos repassar aos órgãos competentes. "

Além da Arena Pernambuco, a Odebrecht participou da construção da Arena Corinthians, da Arena Fonte Nova e da "reforma" do Maracanã. Todos os estádios foram usados na Copa do Mundo.

Por causa da operação Fair Play, a PF cumpriu dez mandados de busca e apreensão no Recife, em São Paulo, em Brasília, em Belo Horizonte, em Salvador e no Rio de Janeiro. Ninguém foi preso.

Diniz explicou que os mandados de apreensão visam coletar documentos em vários escritórios da empresa justamente para comparar quanto a Odebrecht cobrou por determinados serviços na Arena Pernambuco e quanto foi cobrado pelo menos serviço em outras obras realizadas pela empresa.

O representante da PF afirmou que o trabalho de comparação deve demorar. Segundo ele, em quatro meses, a PF terá uma avaliação clara sobre possíveis sobrepreços na construção da Arena Pernambuco.

Empresa nega irregularidades

A Odebrecht negou irregularidades na construção da Arena Pernambuco. Informou que os terrenos que seriam explorados pela empresa sequer foram transferidos para companhia já que o projeto da Cidade da Copa não saiu do papel por falta de investimentos públicos prometidos para o entorno do estádio.

A empresa também informou que o valor dos terrenos não tem qualquer influência nos financiamentos obtidos para construção da Arena Pernambuco. Portanto, segundo a empresa, o argumento a PF não teria fundamento.

A construtora também está sendo investigada na operação Lava Jato, a qual apura suspeitas de fraude em licitação da Petrobras. O presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, está preso desde de 19 de julho, junto com outros executivos.

Favorecimento em licitação

A PF alega ainda que a Odebrecht foi favorecida na concorrência que definiu a empresa construtora da Arena Pernambuco. Segundo Diniz, a Odebrecht foi contratada de forma irregular pelo governo para elaborar um projeto para obra do estádio. Com base neste projeto, a empresa, mais tarde, foi contratada para executar a obra. "Houve uma clara vantagem", disse ele. "Isso está comprovado."

A Odebrecht confirmou que elaborou o projeto para a Arena Pernambuco, mas também nega irregularidades. A empresa alega que sua contratação foi feita baseada na lei que regulamenta as PPPS (parcerias público-privadas).

O governo de Pernambuco ratificou o argumento. Em nota, o Estado também citou a lei das PPPs. Leia o posicionamento abaixo:

"Com relação à operação da Polícia Federal realizada hoje (14.08) na Unidade de Parcerias Público-Privadas, relacionada às obras de construção da Arena Pernambuco pela Construtora Odebrecht, o Governo do Estado de Pernambuco reafirma a disposição de prestar todos os esclarecimentos necessários.

A licitação para a construção da Arena observou todos os requisitos, prazos e exigências da Lei de Licitações e da Lei das Parcerias Público-Privadas (PPPs), tanto que foi julgada regular pelo Tribunal de Contas da União e pelo Tribunal de Contas do Estado.

A Lei das PPPs e a Lei de Concessões prevêem, expressamente, a possibilidade de o autor do estudo de viabilidade do projeto participar da licitação, não decorrendo desse fato qualquer irregularidade, fraude ou frustração do caráter competitivo da disputa.

A Lei das PPPs não exige projeto básico detalhado como requisito para se iniciar a licitação, e, sim, elementos básicos ou anteprojeto. Não há como relacionar a ausência de projeto básico detalhado (admitida pela própria Lei das PPPs) a suposto superfaturamento.

O Governo de Pernambuco reafirma sua posição de absoluta transparência na gestão de recursos públicos e está seguro quanto à correção adotada para firmar a Parceria Público-Privada da Arena Pernambuco."