"Eu e a maioria dos baianos somos Bahia", diz Hernane
Natural de Bom Jesus da Lapa, Oeste baiano, o atacante Hernane, o Brocador, nunca jogou por um time baiano. Terá a primeira chance agora, em 2016, aos 29 anos, pelo Bahia - clube pelo qual, garante ele, toda a sua família é torcedora. Com a responsabilidade ainda maior de comandar a artilharia tricolor após a não permanência de Kieza, o atacante, novo dono da camisa 9, diz que quer se tornar ídolo do Esquadrão nesta entrevista exclusiva ao jornal A TARDE.
Você é natural de Bom Jesus da Lapa, mas nunca jogou num time do estado. Por que?
Saí bem novo da minha cidade, aos 12 anos. Minha mãe foi morar em São Paulo e fui com ela. Lá, resolvi correr atrás mesmo da carreira. Fazia escolinha em Bom Jesus, queria ser jogador, mas naquela época ninguém sabia se ia acontecer ou não. Em São Paulo, comecei a participar de vários testes até que uma hora aconteceu. Sempre tive o sonho de um dia jogar na Bahia, sempre achei que tinha de passar pela terra e sentir um gosto do futebol baiano.
Você acabou estourando um pouco tarde, não foi? Conte um pouco da sua trajetória.
Meu primeiro clube foi a Associação Desportiva Guarulhos, de juniores. Depois fui para o Atibaia, time pelo qual virei profissional. Aí, acertei com o São Paulo em 2007, com uns 19 para 20 anos. Depois, comecei a ser emprestado, para Rio Preto, Toledo, Catanduvense e Paulista, pelo qual tive a primeira sequência boa, na Copa Federação (torneio estadual de segundo semestre), da qual fomos campeões em 2010. No ano seguinte rescindi com o São Paulo porque percebi que minha carreira estava passando e as coisas lá não estavam acontecendo. Fui para o Paraná, mas não tive sequência. Em 2012, voltei a São Paulo e comecei do zero, no Mogi Mirim. Lá as coisas começaram a acontecer. Fui vice-artilheiro do Paulistão. Perdi só para o Neymar, mas isso é normal, né (risos)? Enfrentamos o Santos no mata-mata, infelizmente... Se não fosse isso, acho que teria sido o artilheiro. Depois fui para o Flamengo e aí todo mundo sabe o resto da história.
Como se sente jogando finalmente na sua terra?
Não poderia me sentir melhor! Já trabalhei com o Nei (Pandolfo, diretor de futebol) no Sport e ele me apresentou o projeto do Bahia. Falou do presidente, da estrutura do clube, que aqui se cumprem todas as obrigações, então me despertou algo bom. Achei que esse seria mesmo o momento de retomar meu futebol e vir jogar na minha terra. Hoje me sinto em casa, num clube bom, clube de massa, um clube com muita história.
Para que time daqui você torcia quando era pequeno?
Eu e minha família sempre gostamos mais do Bahia, né? Na minha cidade é assim. Todo mundo tem dois times, é Flamengo e Bahia, Vasco e Bahia... Mas minha família e acredito que a maioria dos baianos em massa torcem pelo Bahia.
Já conhecia Salvador?
Vim pela primeira vez em 2012, para jogar contra o Bahia pelo Flamengo no Brasileirão. Em 2013 voltei para ficar uma semana de férias, mas não dei sorte. Choveu todos os dias e fez um trânsito ruim, não deu para conhecer nada. Agora vou ter o ano todo para isso. Não deu para visitar nada ainda por causa da pré-temporada. São dois períodos de treino por dia e tem que descansar o máximo possível.
E essa expectativa de ser o 'brocador' do time?
Ah, eu gosto disso. No Flamengo eu cheguei desacreditado, jogador que veio do interior paulista com fome de bola, querendo vencer. Mas acho que jogador não tem que viver só do passado, tem que provar todos os dias seu valor. Espero que o ano seja bom para todos e o torcedor pode acreditar em mim porque vou fazer o máximo para ajudar.
Você recebeu uma sondagem do Corinthians depois que chegou ao Bahia?
Procuro focar no trabalho e não olhar muito essas coisas na Internet. Acabei de assinar com o Bahia e não iria embora agora, independentemete de qual fosse a outra equipe. Tenho que defender meu time com unhas e dentes. É aqui que está meu ganha-pão.
O que te atraiu especificamente ao Bahia?
Um pouco de tudo. Jogar no meu estado, no Bahia, com um grupo jovem, um presidente novo também. Você vê a estrutura que temos para treinar, que o clube cumpre com as obrigações em dia... Fui juntando tudo e resolvi vir. Todo mundo falou que eu estava no Sport e podia ter renovado, mas eu quis vir para o Bahia. Tem que olhar tudo o que o clube tem a oferecer, independentemente de ser Série A ou B. O jogador não pode errar na escolha, até pelo momento que o país passa, de crise.
Em 2014, quando estava em alta no Flamengo, você decidiu ir para o Al-Nassr (ARS), mas voltou seis meses depois, com salários atrasados e colocando o clube na Justiça para obter a liberação. Arrependeu-se de ter deixado o Fla?
Foi uma experiência que não vejo como ruim, mas como uma vivência boa. Hoje, se tivesse outra proposta assim, não sei se iria novamente. Tem coisas que precisam acontecer na nossa vida para que a gente aprenda. Estava num momento muito bom no Flamengo quando chegaram algumas propostas dos Emirados Árabes e da China, e o Flamengo rejeitou todas. Depois veio essa, da Arábia Saudita, e eu fui. Quando cheguei lá, minha adaptação não foi como eu esperava, demorei muito... Também fiquei três meses sem receber salário. Daí entrei na Justiça e voltei para o Brasil, mas sabia que ia ser um processo difícil e que ia demorar para ficar livre. O clube sempre nega, você tem que buscar seus direitos na Fifa... Foi bem difícil.
O que você diria a outros jogadores nesse momento em que muitos deles estão deixando o Brasil para jogar na China ou no Oriente Médio?
A China não sofre desse problema de salário ainda, né? Mas no mundo árabe o jogador tem que analisar bastante, procurar informações do clube com outros jogadores que passaram por lá... Eu, por exemplo, se tivesse escutado, não teria ido. O Elton (atacante, ex-Vitória) tentou falar comigo, pois jogou lá também, mas eu já tinha viajado e não pude ouvi-lo, infelizmente...
Por conta desse problema na Justiça você ficou um bom tempo sem jogar no ano passado, certo? Te atrapalhou?
Fiquei o primeiro semestre inteiro sem jogar. Só fui entrar em campo pelo Sport na 18ª rodada do Brasileiro... Perdi um turno praticamente inteiro. Dificilmente eu ia ter a sequência que eu precisava para mostrar meu trabalho. Foi um ano muito ruim, infelizmente.
Você é um centroavante que precisa de 'garçons' no time para ajudá-lo. Quem são os candidatos no Bahia?
Por enquanto não dá pra falar, porque a gente não tem um time titular definido. O Doriva tá trabalhando isso ainda, procurando passar as ideias dele pra gente e a gente tentando se entrosar. Acho que afinidade é normal ter mais com uns do que com outros. Mas temos vários companheiros de alto nível, Luisinho, Edigar, Maxi, Mário, Zé Roberto... Isso é bom porque a dor de cabeça boa é do Doriva, não minha (risos)!
Faz questão de ser o ídolo do time nessa temporada?
Sem dúvida. O momento que passei no Flamengo me ajuda nesse momento no Bahia. Sei que alguns jogadores adversários me respeitam, sabem que eu sei fazer gol mesmo... Espero fazer muitos gols aqui para que a camisa do Bahia seja bastante vendida (risos)!