Postado por - Newton Duarte

FIFA 15 sem brasileiros desagrada clubes e empresa: entenda

FIFA 15 sem brasileiros desagrada clubes e empresa: entenda a questão

Empresa responsável pelo jogo busca acerto para as próximas edições, e clubes são parceiros para não perder visibilidade internacional proporcionada pelo game

Messi no Fifa 15: em outros países, negociação é direto com as ligas

Os gols de Ricardo Goulart, as defesas de Rogério Ceni, os passes de Conca, os dribles de D’Alessandro – nada disso estará presente no Fifa 15, a mais recente edição do game que fideliza fãs mundo afora. Acontece que a EA (Electronic Arts), empresa responsável pelo jogo, não encontrou segurança jurídica para usar os direitos de imagem dos jogadores que atuam no Brasil em seu banco de dados. O resultado é decepção geral: para os criadores do jogo, para o público, para os clubes e para os próprios atletas.

A situação não é simples. A EA negocia diretamente com os clubes, e aí não encontra problemas: está de acordo com todos os da Série A e poderia usar suas marcas tranquilamente. Os clubes, por sua vez, fazem acordos de direitos de imagem com seus atletas para usos múltiplos, mas esse é um universo muito heterogêneo. A empresa percebeu um ambiente nebuloso, no qual ter um acordo com as equipes não é sinônimo de ter um acordo com os atletas. E não encontrou um órgão que os representasse conjuntamente nesse tipo de negociação.

- Ficou claro que não está claro – resumiu Jonathan Harris, gerente de negócios da EA no Brasil.

Sob pena de sofrer processos por uso indevido de imagem dos jogadores, a EA resolveu não correr o risco. Ao firmar acordo com os clubes, a empresa se sente segura para usar seus nomes, suas cores, suas camisas, seus escudos. Mas os jogadores, com seus nomes próprios, com a representação de suas feições e características físicas, fogem desse universo. É esse o acordo que falta.

- Com os clubes, o acordo é sobre uso de escudos, de camisas, o nome do clube. Mas isso não significa direito de imagem dos jogadores. Mesmo que alguns clubes digam que têm, é difícil ter certeza disso. De qualquer forma, se a EA usar o nome do jogador e o jogador não quiser, ele vai atrás da EA, não do clube. Tem que falar com cada jogador, com cada clube, com empresário... – explica Harris.

EA prefere não colocar jogadores com nomes fictícios, mesmo tendo acordo com os clubes

Diante do cenário, a EA mergulhou em uma dúvida prática: usar os clubes brasileiros e não usar os jogadores (modificando seus nomes) ou simplesmente fechar o jogo sem atletas e equipes daqui. Optou pela segunda possibilidade. Se preferisse a primeira, teria discrepância entre o Brasil e outros países, onde a representação é fiel – onde Messi se chama Messi, é parecido com Messi e simula o estilo de jogo de Messi.

É uma questão de burocracia. Ao fazer um jogo sobre a NFL, a liga de futebol americano, a EA faz duas negociações: com a própria NFL, para o uso da imagem dos clubes e do campeonato, e com uma associação que representa os jogadores. Com isso, consegue fazer um acordo coletivo. No Brasil, a partir do momento em que percebeu que não seria possível ter uma negociação no mesmo patamar, a solução seria tratar individualmente com cada atleta. Mas são centenas deles. É inviável.

Em um número mais reduzido, o cenário se torna mais simples. Foi o que aconteceu com os jogadores da Seleção. A EA negociou com a CBF, que tem acordo com os atletas, e eles estarão no jogo. Os brasileiros que atuam no exterior também estão garantidos, já que a negociação é diretamente com as ligas locais, o que não acontece no Brasil.

DECEPÇÃO GERAL

A situação é ruim, claro, para o próprio jogo - como negócio. Mas a decepção vai muito além dele. Os clubes brasileiros admitem desconforto e estimam perda significativa em exposição internacional da marca. Como o game tem alcance global, acaba servindo para fortalecer uma imagem que não chega a muitos países por meios tradicionais – com transmissão de jogos, por exemplo.

Ficar fora desse tipo de mídia tem impacto, ainda mais em um público mais jovem, que consome futebol, que vai crescer e está em formação

Izael Sinem, diretor de marketing do Timão

- É muito difícil avaliar o tamanho do impacto. Mas é a exposição da marca do clube em âmbito global. Ficar fora desse tipo de mídia tem seu impacto, ainda mais em um público mais jovem, que consome futebol, que vai crescer, que está em formação – comentou Izael Sinem, diretor de marketing do Corinthians.

A indefinição acontece em meio à vigência de contratos. Os valores de 2014 foram recebidos pelos clubes que têm acordo com a EA. Mas o preço real da presença no jogo extrapola as cifras acordadas para licenciamento, como observa Marcone Barbosa, diretor de marketing do Cruzeiro.

- Trata-se da exposição da marca em uma plataforma mundial. Isso talvez seja muito maior do que o próprio recurso. São amantes de futebol do mundo todo. É uma conta que não tem como mensurar – opinou.

Fifa 15 terá jogadores da Seleção e brasileiros que atuam em ligas estrangeiras

Alguns clubes, caso do Fluminense, disseram que foram comunicados da decisão pela própria EA. Outros, como o Cruzeiro, afirmaram que não houve uma formalidade. Em geral, as diretorias de marketing relatam boa relação com a empresa – e a recíproca dela é a mesma. Por outro lado, o Santos divulgou um comunicado em tom de cobrança. Um trecho do texto do Peixe diz: “Em nota oficial, a empresa Electronic Arts alega ‘que não conseguiu chegar a um acordo com os detentores dos direitos dos jogadores’. O Santos FC esclarece que, em nenhum momento, foi procurado pela empresa para qualquer acordo”.

O FUTURO

Higuaín em ação no Fifa15

A versão 2015 do game está em estágio de finalização. A empresa não dá qualquer esperança de que o impasse possa ser resolvido em tempo. Os brasileiros efetivamente não estarão presentes desta vez. Mas a esperança é de um acordo para as edições posteriores.

- Para o Fifa 15, não tem como. Já está em reta final, e a complexidade é alta. Mas isso não quer dizer que não possamos resolver para o futuro – disse Jonathan Harris.

Mas como resolver? O gerente de negócios da EA diz que não cabe à empresa tomar decisões que pertencem ao futebol brasileiro.

- Nosso papel é entender as normas, as leis que existem. É o Brasil que precisa decidir isso. Cada cultura tem sua maneira de fazer as coisas, e respeitamos.

Vontade não deve faltar aos clubes para se alcançar um acordo, mesmo que ainda não exista um plano. Eles são os primeiros interessados em ter sua marca exposta no jogo.

- Temos total interesse em manter a parceria com a EA Sports, pois é importante para a marca Fluminense, nossos patrocinadores, jogadores e torcida. É um produto premium, de circulação mundial e de enorme sucesso entre os torcedores. Lamentamos e estudaremos uma solução junto aos outros clubes brasileiros para os próximos anos. Não só o clube perde, mas a marca do futebol brasileiro – opinou Lucas Sodré, gerente de Marca e Licenciamento do Fluminense.

REAÇÃO DO PÚBLICO

A decisão da EA foi comunicada na última quarta-feira, dia 30 de julho. E imediatamente causou furor no público do jogo, decepcionado com a perda de conteúdo. Alguns elementos da brincadeira, mesmo que não centrais, ficam prejudicados, como observa Diego Borges, editor de games do site TechTudo:

- Os jogadores de Fifa no Brasil optam por usar times de outros países devido à diferença gigante entre os atributos dos atletas virtuais. Ou seja, não há como colocar, por exemplo, Cruzeiro contra Real Madrid. O time espanhol é absurdamente superior ao clube nacional. Entretanto, a ausência será sentida em alguns momentos, como na oportunidade de conferir seu clube - e respectivos uniformes - em um nível de realismo como o do Fifa 15, principalmente em uma brincadeira descontraída contra amigos no mesmo videogame ou online.

É uma perda grande em conteúdo. Não estamos felizes com isso. Mas esperamos que não tenha um impacto significativo em vendas

Jonathan Harris, gerente da EA no Brasil

A questão é se a ausência dos brasileiros influenciará na fidelidade dos consumidores – muito em especial os brasileiros - e, consequentemente, na venda do produto. Para Jonathan Harris, o game compensa em outros elementos.

- É uma perda grande em conteúdo. Não estamos felizes com isso. Mas esperamos que não tenha um impacto significativo em vendas. Porque todas as outras características ainda valem. Os brasileiros vão fazer falta, mas mantemos o resto, inclusive nossa ótima jogabilidade – diz o gerente da EA.

Diego Borges concorda.

- Não acredito em um impacto tão grande nas vendas, principalmente em uma migração para o PES 2015. Primeiro, porque o game da EA ainda é muito superior ao da Konami. Além disso, como disse anteriormente, mesmo com todos os clubes nacionais licenciados, os jogadores ainda prezam pela qualidade. E isso o Fifa 15 tem de sobra


Fonte: Alexandre Alliatti – GE.COM

Foto: Divulgação