Postado por - Newton Duarte

Homens trabalhando: 100 dias da gestão de Fernando Schmidt

Em obras: Após 100 dias de gestão, Schmidt revela clube em 'refundação'

Presidente do Bahia faz balanço da gestão e diz ter impressão que grupo antecessor administrava o clube com o código penal

O cenário é o mesmo de sete meses atrás. Um edifício de alto padrão no coração comercial de Salvador. No 25º andar, o caminho percorrido até o escritório do Esporte Clube Bahia ainda lembra um passado recente. O responsável pela segurança é o mesmo, assim como a decoração da sala de espera. No entanto, o entra e sai das salas denúncia um clima diferente, um clima de reformulação. Esporte Clube Bahia, um clube em obras. Um clube em reconstrução.

Fernando Schmidt despacha na sua sala em um prédio de alto padrão em Salvador

A sala onde o presidente Fernando Roth Schmidt fica ao lado do recinto onde, em maio deste ano, o ex-presidente Marcelo Guimarães Filho, afastado pela Justiça em julho. Primeiro presidente eleito de forma direta na história do Bahia, Fernando Schmidt admite as dificuldades e diz que gostaria de ter adiantado algumas coisas que ainda precisam ser trabalhadas. Pela segunda vez à frente do Tricolor, a primeira foi no final dos anos 70, Schmidt não mede palavras para revelar detalhes dos primeiros 100 dias comandando o clube do coração.

Na decoração da sala, quase tudo é Bahia. A única exceção é um livro sobre Pelé. As duas taças dos dois títulos nacionais conquistados pelo Bahia, em 1959 e 1988, encontradas pela atual gestão em sacos de lixo, agora têm lugar de destaque na sala do presidente, assim como o troféu Torcida de Ouro, dado pela CBF à torcida do Bahia em 2010. A semana corrida do presidente só permitiu um lugar na agenda, dois dias após o complemento dos 100 dias. No começo do bate-papo, Schmidt se mostra surpreso com a passagem de tempo.

Decoração da sala de Fernando Schmidt tem livro de Pelé, caricatura e taças

- Já tem 100 dias?  - se surpreende.

Desde ao dia em foi empossado presidente, em 9 de setembro, até dia 20 de dezembro, data em que recebe o GloboEsporte.com em seu gabinete, Fernando Schmidt esteve à frente do Bahia por 102 dias. O mandato ‘tampão’ vai até o final de 2014 e não prevê reeleição.

De semblante sereno, o presidente não sobe o tom em momento algum, mas mostra convicção para afirmar que o clube vai à Justiça pedir ressarcimento dos prejuízos causados pela antiga gestão. E repete a mesma convicção para garantir que, no futuro, irá trabalhar para não permitir o retorno do antigo grupo, ainda que por meios democráticos. Para Schmidt, o Bahia era governado sem planejamento e sob a ótica do código penal.

- Eu tenho a impressão de que sobre a mesa dos antigos dirigentes, não tinha nenhum livro sobre planejamento ou legislação moderna de futebol, eu acho que tinha o código penal. Porque tem tantos delitos previstos aqui praticados pelos antigos dirigentes que deveria ter um código penal para fiscalização conhecer os tipos. Porque aqui tinha tudo. De apropriação indébita, gestão temerária, emissão de cheques ao portador, enfim, evasão fiscal, destruição da imagem do Esporte Clube Bahia como patrimônio a ser preservado – diz.

Em quase uma hora de conversa, o presidente rasga elogios à torcida e diz que ela será valorizada ainda mais em 2014. Schmidt ainda fala sobre o apoio do Bahia ao movimento Bom Senso Futebol Clube, critica a ação do STJD que rebaixou a Portuguesa e fala sobre o fim da doação de ingressos para as torcidas organizadas. Para ele, o novo Bahia passa por uma mudança cultural. Entra em cena orçamento e planejamento, duas palavras repetidas como mantra pelo gestor.

Observador, Schmidt também é bom de papo. Ao perceber o livro que serve de apoio para o entrevistador, o presidente dispara.

- Esse eu já li. É bom. Tem outro bom também contando a história do Bayern. Uma história bem diferente desta do Barcelona - diz.

O "livro-apoio" em questão conta a história recente do Barça. Assim como o autor e ex-dirigente blaugrana Ferran Soriano, Schmitd terá que provar que "A bola não entra por acaso". Para o presidente tricolor, é tempo de refundação.   

Fernando Schmidt faz balanço dos primeiros cem dias à frente do Esporte Clube Bahia

GE.COM:São mais de três meses à frente do Bahia, depois de uma grande luta pela abertura do clube. Como você analisa esse período de mudança?

FERNANDO SCHMIDT:Acho importante esse balanço para torcida ter noção do que aconteceu fora a luta heroica para manter o clube à tona e na mesma divisão. Eram dois grandes objetivos que tínhamos. Recebemos o clube numa situação verdadeiramente de falência. Tenho a impressão de que se não fosse a intervenção, logo depois a aprovação dos estatutos, a nova filosofia, o Bahia não chegava ao final do campeonato. Não chegava porque Bahia ia falir. Simplesmente ia falir. Não tinha mais de onde tirar dinheiro e como a Mega-Sena da Virada é só no final do ano, não ia dar tempo (risos). Era uma situação muito difícil. Era uma situação onde nós tínhamos que, em primeiro lugar, garantir as condições mínimas para que o Bahia sobrevivesse com suas receitas que eram insuficientes e ao mesmo tempo com o elenco que tinha, até porque quando assumi tínhamos 15 dias para contratar, a janela era de um tempo curtíssimo. E mesmo que a janela fosse de um mês, não tinha dinheiro para contratar. Então nós tivemos que apoiar essa equipe, mantendo a coesão sobre comando de Cristóvão Borges, que naquela época garantiu fazer todo esforço para que o Bahia permanecesse na Primeira Divisão. Porque a queda do Bahia para a Segunda Divisão significava também a queda da receita, da credibilidade, da própria adesão a esse projeto novo de democracia, transparência e profissionalismo que é a marca desse novo estatuto.

Terminar o ano na Primeira Divisão foi a garantia de um ano sanado financeiramente?

<<Sobre a mesa dos antigos dirigentes, eu tenho a impressão de que não tinha nenhum livro sobre planejamento ou legislação moderna de futebol, eu acho que tinha o código penal>>

Fernando Schmidt

Felizmente conseguimos manter o clube na Série A, mas isso não significa que terminamos 2013 zerados. Terminamos o ano devendo R$ 10 milhões. Entre custeio e folha de jogadores. Para isso tivemos que recorrer a práticas que não são as melhores como antecipação de receitas para poder fechar o exercício de 2013 e assim começar uma nova era dentro do Esporte Clube Bahia onde nos trabalhamos com orçamento e com planejamento. Tivemos uma reunião de conselho, a quinta em cem dias, e pela primeira vez na história do Esporte Clube Bahia foi apresentado um orçamento e um planejamento das ações de todos departamentos e diretorias para que a gente pudesse ter esse controle e essa sintonia fina com o que está acontecendo. Até porque o orçamento não é uma peça engessadora. É uma peça que vai convivendo com a vida, mas sempre com metas, com objetivos bem definidos. Aqui dentro do Esporte Clube Bahia, planejamento e orçamento eram coisas que os antigos dirigentes corriam quando se falava.

Qual a importância desse planejamento para a vida do clube?

Com planejamento e orçamento você tem transparência, controle e fiscalização. Quando não tem transparência, se faz o que quer. Mistura os interesses pessoais com os coletivos e quem sai perdendo sempre nessa promiscuidade é o coletivo, é o Bahia. Sobre a mesa dos antigos dirigentes, eu tenho a impressão de que não tinha nenhum livro sobre planejamento ou legislação moderna de futebol, eu acho que tinha o código penal. Porque tem tantos delitos previstos aqui praticados pelos antigos dirigentes que deveria ter um código penal para fiscalização conhecer os tipos. Porque aqui tinha tudo. De apropriação indébita, gestão temerária, emissão de cheques ao portador, enfim, evasão fiscal, destruição da imagem do Esporte Clube Bahia como patrimônio a ser preservado. Nossas duas taças de 59 e 88 estavam no lixo, encontramos quando abrimos as salas alugadas e vazias desde dezembro. Dentro de sacos de lixo! Isso provocou uma revolta extraordinária não só nos atletas que participaram... Bobô chorou quando viu o troféu num saco de lixo. A torcida ficou indignada em relação a esse tipo de tratamento que era dado as coisas patrimoniais, seja físico ou imaterial.

Dá pra dizer que o Bahia hoje é um clube em reconstrução?

Em reconstrução. Eu diria que a palavra é essa mesma, mas iria até mais longe. Eu diria que o Bahia é um clube em refundação. Porque, a partir daquelas duas históricas assembleias onde se aprovou um novo estatuto e se elegeu nova diretoria e conselho e esse conselho pela primeira vez um conselho fiscal, nós estamos refundando o Esporte Clube Bahia. Refundando institucionalmente, trazendo instrumentos de democracia direta para que possam facilitar o contato entre torcedores, sócios, dirigentes. Quando foi decretada a intervenção, o Bahia tinha 600 sócios. Hoje tem 16 mil. Tinha 600 que formavam a Assembleia Geral antiga, que comparecia uns 200 e elegiam 300 conselheiros. Era um negócio impensável. Mas acontecia. O desafio foi primeiro buscar receitas para chegar ao final do exercício. Que nós estamos, digamos assim, fechando o cumprimento agora pra zerar as coisas de custeio e a folha em dezembro. Há um passivo acumulado com fornecedores, tributos, continuações, valor que vai para mais de R$ 80 milhões. Essa parte, eu nem estou cuidando agora, a não ser, aqueles acordos trabalhistas já feitos e que precisam ser honrados sob pena da receita que tivermos ser bloqueada no banco pela Justiça e não podermos usar.  

Na ponta dos dedos: Bahia terá orçamento e planejamento, diz Fernando Schmidt

Quais as principais ações que você considera ter feito nesses 100 dias e qual a maior dificuldade?

Eu acho que o principal feito não é uma coisa assim material. Eu considero o maior feito dessa gestão a apropriação por parte da torcida que as coisas não podiam continuar como estavam. O torcedor, o sócio, continua lutando por bons resultados. Todos nós estamos nesse mesmo barco, mas também essas mesmas pessoas estão convencidas que o Bahia não podia continuar a ser dirigido da forma que era. Onde o interesse privado era promíscuo com o interesse coletivo. E sempre o privado era o grande beneficiado em detrimento do interesse coletivo que era o Esporte Clube Bahia. Não é por outra razão que existem hoje representações dos Ministérios Públicos Federal e Estadual, e ações em curso feitas pelo Bahia e que não precisam passar por esses dois órgãos, no sentido de acionar esses ex-dirigentes para que eles devolvam ao Bahia aquilo que através de uma gestão temerária e, quem sabe até fraudulenta, praticaram. De repente, você sentiu que as pessoas passaram a acreditar nesse Bahia novo. Acho que essa é grande conquista. Claro que permanecer na Primeira Divisão também é uma grande conquista, mas seria pouco. Que dizer sobretudo pelo comportamento da maioria dos torcedores, que não estão apenas preocupados em permanecer na 1ª Divisão, ter bons times e conquistar resultados. O que eles querem ter é uma gestão eficiente, honrada, democrática, transparente e profissional.

O que você gostaria de ter mudado no clube e que ainda não conseguiu?

<<Para quem tinha 600, ter 16 mil sócios é muita coisa. Mas porque não 50 mil? É a nossa meta para esse ano. Podemos ter mais. Internacional tem 100 mil sócios. Porque não ter 100 mil? E com a receita do sócio conseguir resolver boa parte de seus problemas operacionais>>

Fernando Schimdt

Eu acho que podíamos, digamos assim, ter avançado mais, embora o tempo fosse muito curto. Cem dias, mesmo trabalhando diuturnamente, é um tempo insuficiente, mas certas coisas precisavam já estar tornadas públicas, mais consolidadas do que estão. Temos um ano de gestão pela frente e vamos ter que correr para implantar uma mudança cultural dentro do Esporte Clube Bahia. Quando você fala de orçamento e planejamento você está falando em substituir uma cultura por outra, e não se substitui uma cultura por outra batendo o dedo. Você precisa ter união, porque muitas serão as resistências e cobranças, internas e externas. Você precisa ter união, capacidade de resposta para dar os passos necessários para ao final do ano de 2014, ter um planejamento ou as diretrizes do Esporte Clube Bahia para os próximos 20 anos. Para quem tinha 600, ter 16 mil sócios é muita coisa. Mas porque não 50 mil? É a nossa meta para esse ano. Podemos ter mais. Internacional tem 100 mil sócios. Porque não ter 100 mil? E com a receita do sócio conseguir resolver boa parte de seus problemas operacionais. Nesse período fizemos uma revisão detalhada de todos os contratos. Revisamos vários para que trouxerem reais benefícios ao Bahia e não que beneficiassem a outra parte. Podiam até beneficiar os ex-dirigentes do Bahia, mas ao Bahia não.   

Do Schimdt do final dos anos 70 para o Fernando Schmidt de hoje, o que mudou?

Mudou muita coisa. Fui presidente por quatro anos na década de 1970 e não era fácil a situação do Bahia. E no contexto nacional, vivíamos uma ditadura e se mover dentro de uma ditadura era uma coisa complicada, não só para os clubes, mas para todos. Mesmo assim conseguimos fazer uma revolução patrimonial no Bahia. Vendemos a Fazendinha para nos livrarmos da apropriação de receita bancaria que o BANEB fazia e que praticamente inviabilizava toda nossa receita de bilheteria. Construímos a primeira etapa do Fazendão, lançamos uma promoção Bahia Gigante, que ajudou a fazer isso, e quando foi necessário para concluir as obras do Fazendão e não tínhamos mais capacitação de recursos. Nós vendemos dois dos nossos melhores jogadores, Jorge Campos e Perivaldo [Peri da Pituba], e com a receita dessa venda, não só mantivemos a boa qualidade do nosso departamento de futebol, como concluímos o Fazendão e reformamos a nossa sede de praia. Pergunte agora o que o Bahia tem hoje de patrimônio material. A sede de praia tá no chão transformada em Transcon (Transferência de Construção), o Fazendão entrou em um processo de permuta com um novo Centro de Treinamento onde existe uma série de dúvidas. Criamos uma comissão para saber se as coisas foram devidamente avaliadas ou se o Bahia foi lesado nessa transação. Tenha certeza, só vamos para lá se as coisas ficarem muito claras a respeito dessa negociação.  

Você fez um discurso de posse muito bonito e lembrou velhos companheiros de luta. Foi um momento especial na sua vida?

Sem dúvida alguma. Essa é uma diferença em relação aos anos 70. Eu me senti naquele momento tomando posse em nome dos sócios e da torcida. Eu não estava apartado disso. Era a torcida do Bahia assumindo a direção do clube, Por isso o lema da campanha era 'O Bahia tem dono: seu sócio e seu torcedor'. E veja, naquele momento até hoje, mesmo com os muitos problemas e angustias que a gente passou, nunca deixei de ouvir de ninguém quando saio e percorro a rua, sem segurança, porque não preciso, as pessoas que se encontram comigo podem fazer críticas, cobranças, dizer o que quiser, mas uma coisa todos dizem: “Presidente, não esmoreça, você não está sozinho. Estamos com você”. Essa sensação de não estar sozinho não tem preço.  

Como anda a prometida auditoria nas contas? O Bahia deixou de revelar algum dano cometido contra o clube ou ainda podemos esperar alguma coisa?

O resultado dela foi acolhido pelo Ministério Público Federal e pelo Ministério Público Estadual. As várias coordenações dos ministérios que tem a ver com os delitos encontrados e aparentemente encontrados estão sendo alvo de investigação, oitivas, depoimentos, para que o MP possa apresentar a seguir, tenho certeza que não terá dificuldade de apresentar denúncia para que todas essas questões sejam análises do poder judiciário. E também serão analises do poder judiciário as ações que nós do Esporte Clube Bahia estamos dando entrada para que o dinheiro mal aplicado e o prejuízo causado sejam reparados.

Há uma preocupação com as ações na Justiça do grupo que comandava o clube?

Eu não tenho nenhuma preocupação em relação a isso. Os ex-gestores já entraram na Justiça tanto aqui na 1ª instância, como no TJ, como no STJ, oito vezes. E Continuam dizendo que vão voltar. Talvez na vã tentativa de dar sumiço aos mal feitos que foram praticados ou criar instabilidade como trataram de fazer com a intervenção para que ela tivesse dificuldade na gestão do clube. Se estamos negociando com um patrocinador e há alguém dizendo que vai voltar, o outro lado se pergunta: 'Será que volta?', 'Será que é com essa pessoa que tenho que negociar?'. Mas do meu lado eu tenho tranquilidade. E mais, digo como dirigente do Bahia e como advogado.  

Como fazer o torcedor acreditar que esse é um novo Bahia? O que você espera do Bahia para 2014? É um time que vai brigar por títulos, ou um time que não vai para ser protagonista?

<<Não vai ser um elenco que vai ter Neymar ou Messi aqui dentro, mas vai ser um elenco com condições de competitividade em todos os torneios que o Bahia disputar em 2014, e, sobretudo com aguerrido espírito vencedor>>

Fernando Schmidt

A primeira grande mudança que nós fizemos para 2014 foi alterar completamente a filosofia do departamento de futebol profissional. A prática anterior era de empresários entregarem caminhões de jogadores aqui. Depois se contratava um técnico e o treinador era obrigado a, com esse material que aqui ficou, dar seu jeito. Isso acabou. Nós fizemos exatamente o contrário. Primeiro fomos buscar um diretor de futebol, que é o William [Machado], um treinador [Marquinhos Santos], que depois de montada suas respectivas comissões técnicas, pequenas, enxutas e juntamente com a diretoria, e aí destaco a figura do vice-presidente Valton Pessoa e do assessor especial da presidência Sidônio Palmeira, e o restante, juntos montando esse novo elenco. Não vai ser um elenco que vai ter Neymar ou Messi aqui dentro, mas vai ser um elenco com condições de competitividade em todos os torneios que o Bahia disputar em 2014, e, sobretudo com aguerrido espírito vencedor. Não posso garantir, nem prometer que vamos ganhar todos os títulos porque seria além de demagógica, falsidade. Mas posso garantir que esse time vai dar orgulho à torcida e aos sócios. Será um time absolutamente ligado a essa filosofia do novo Bahia no campo institucional. Marquinhos e William tem uma sintonia fina com o que nós dizemos. Até a próxima semana vamos anunciar nomes que vão formar essa nova equipe e tenha certeza que dentro dessa nova equipe também haverá uma revolução nas divisões de base, que foram tão renegadas a segundo plano nas antigas gestões.  

Que tipo de reforços podemos esperar para o ano que vem? Reforços de nível alto, jogadores de nome, ou um clube mais pé no chão, que faz apostas, mas que não vai deixar de ousar?

Jogadores de alto nível, eu não diria. Mas serão jogadores bons, que não estão fora das possibilidades orçamentárias. Jogadores que poderão vir através do fundo de investimentos com a colaboração de investidores e jogadores que sabem que o Bahia é um clube que recuperou credibilidade e que cumprirá seus compromissos. Da mesma forma que também espera compromisso dos jogadores com a garra e velha tradição tricolor.   

Você foi eleito em um ano importante para o futebol brasileiro em termos políticos. Como você vê o Movimento Bom Senso?

Bahia foi o primeiro clube a apoiar o movimento do Bom Senso Futebol Clube. Até porque entende que o Fair Play financeiro e obrigações em demanda que os clubes têm precisam ser cumpridas, e se não forem, tem que ser penalizadas. Agora o Bahia entende também que para ser completo, o Bom Senso deve olhar também a parte de um setor dentro do futebol que precisa ser regulamentado que é o limite de salários. Se nós continuarmos inflacionando os salários da forma como vinham sendo, 90% dos clubes brasileiros não terão condições de cumprir as legítimas demandas do Bom Senso. Acho que essa consciência é muito presente em muitos jogadores e que isso vai ser uma das grandes coisas que teremos no futebol brasileiro. Nosso futebol está mudando. O que era nosso futebol até pouco tempo atrás? Era sempre o clube batendo na porta do governo pra conseguir anistia, alongamento de dívida ou perdão fiscal. Sem nenhuma contrapartida. Hoje não. É claro que é necessário ter um novo perfil. É necessário ter um refinanciamento da dívida, mas você tem que assumir compromissos também. E garantir ao governo que esta gestão financeira não será temerária sob pena dos benefícios serem cancelados. E será também uma gestão democrática com mandatos com duração. Tenho ouvido isso em vários fóruns. No Senado, na Câmara, no Ministério do Esporte, o que se espera é que os dirigentes possam ser reeleitos apenas uma única vez. E não transformar o clube em capitania hereditária, como era a prática não só no Bahia, mas em outros clubes brasileiros. O Bahia não esta pensando sozinho nisso não. Tem vários clubes pensando desta mesma forma. O que o Bahia fez foi sair na frente e assumir o ônus do pioneirismo e por isso tem sido tão requisitado nesses fóruns que falei, para levar suas ideias e propostas.

Fernando Schmidt critica decisão do STJD

Por outro lado, como você vê a situação do campeonato decidido no STJD?

Para mim for uma surpresa. Achei que era um procedimento acabado no futebol brasileiro. Vejo que não. Não estou defendendo que seja disputado sem regras ou lei, nem que as obrigações sejam esquecidas e só valha o resultado do campo seja qual for o meio utilizado para isso. Agora o que estou dizendo é que em primeiro lugar é o resultado em campo. Eventuais problemas que precisam ser corrigidos, mas a forma de punição não pode ser com anulação de resultados ou perda de pontos. Onde estão as penas pecuniárias (penas de multa). Porque não são utilizadas? Porque tem que se passar a ideia de que o que aconteceu em campo não vale mais? Não me parece estranho que um advogado tenha informado mal um determinado clube, ou a CBF tenha dado informação errada e com base nisso tenhamos toda essa celeuma que está se fazendo? Eu acho tudo isso muito suspeito.  

Outra coisa que marcou o final do ano foi a violência das torcidas organizadas. O Bahia já parou de doar ingressos, mas ainda existe algum tipo de relação com as organizadas?

Isso não foi fácil. Havia o hábito de destinar parte dos ingressos para as organizadas E quando percebemos, parte desses ingressos era negociada com cambistas e entravam de volta para a torcida organizada como receitas não adequadas. Preferimos, mesmo sabendo que íamos comprar brigas e ter desagravos, acabar com isso. E não nos arrependemos. Não sou contra torcida organizada. Nos anos 70, fiz a primeira torcida organizada do Bahia, a Força Jovem, cujos dirigentes estão aí até hoje. A coisa era diferente. Não tínhamos essa coisa de a torcida tem dono. O dirigente é dono da Torcida Organizada, seja lá com que objetivo. A torcida organizada é importante. Ela tem condições de buscar patrocínios e nós temos até a capacidade de ajudá-las sem precisar essa coisa de usar a receita do clube. Os ingressos que eram distribuídos dessa forma foram redistribuídos com os sócios. Levamos a um shopping, numa ação por ingressos, número de gente que o shopping nunca viu. São formas heterodoxas. Não são só os fundos de capacitação. Precisamos ser inventivos o máximo. Na medida que entre mais dinheiro, nós não vamos afrouxar o controle das despesas. Não vamos voltar o velho desperdício, mas vamos ter mais para aplicar melhor. Arrecadamos mais de R$ 100 mil com as camisas da democracia na promoção com esses ingressos de venda proibida. Era uma parceria da camisa da democracia com o ingresso. O torcedor comprava a camisa e ganhava o ingresso.

Fernando Schmidt promete lutar pela manutenção dos preços populares na Fonte Nova

O Bahia passou um tempo distante do seu torcedor em 2013, por uma série de fatores. Entre eles, o preço dos ingressos na Fonte Nova. A ideia para 2014 é manter os preços populares na Fonte Nova?

Há um fato emblemático nesses seis meses. Mudamos do público zero para casa cheia. E não foi só por amor. Demos condições, através de novas negociações com a Arena Fonte Nova. Pessoas que não tinham condições de ir, de pagar. Vamos tentar e vamos procurar meios para manter a tendência do ingresso mais barato. Isso não é bom só para o Bahia. É bom para a Arena, é bom para o governo do estado. Aquilo lá é uma Parceria Público-Privada. E na medida em que haja equilíbrio financeiro, o governo do estado não precisa entrar com toda parte que faltava em contrapartida. É bom para todo mundo. Recentemente procurei o governador para mostrar a experiência que tem sido feita em Pernambuco com um programa de notas fiscais e educação tributária, semelhante aquele Sua Nota é um Show, que tínhamos aqui, mas bem mais aperfeiçoado, e que garante uma média de público de 12 mil torcedores no estádio. Quantos jogos tivemos com média abaixo de 12 mil? Deu prejuízo? Claro que deu! Bahia é um time de respeito. Precisa voltar a ter sua alto estima elevada. O Bahia quando entrou no Canindé para enfrentar a Portuguesa, quando entrou para jogar com o Náutico, na Arena Pernambuco, nas duas vezes, tinha mais torcedor nosso do que dos donos da casa. Isso não é um patrimônio intangível? Não é só um atleta que é. A torcida do Bahia é um patrimônio intangível. E ela precisa ser valorizada. O Bahia precisa honrar os seus compromissos para readquirir a credibilidade que teve no passado e começa a voltar a ter, que é a condição básica de um time vencedor.

Você entrou no clube com a missão de arrumar a casa, mas 2014 já é ano de eleição. Já há uma preocupação com o sucessor do Schmitd? Até porque há uma preocupação em deixar a casa arrumada, mas também para uma figura que seja alinhada a seu grupo?

Eu não estou preocupado com isso agora. Claro que chegará o momento que isso também será objeto de preocupação. O que não podemos permitir é que aqueles que fizeram mal ao Bahia queiram voltar pelas vias democráticas que nós instalamos dentro do Esporte Clube Bahia.

Cem dias depois do começo da sua gestão, que Bahia é esse?

Um Bahia que conseguiu sair do estado de insolvência, ainda tem grande dificuldade pela frente. O ano de 2014 vai ser o ano em que vamos definir as diretrizes estruturantes para o Esporte Clube Bahia em todos os seus setores e lançar as bases para um planejamento estratégico. O Bahia é um clube que além de democrático, busca cada vez mais a democracia. Estamos criando ouvidoria que permita um contato mais próximo do torcedor, através de diretoria de comunicação, com as redes sociais e outros meios. Estamos dando um novo papel às embaixadas do interior da Bahia, pelo Brasil e até mesmo fora do Brasil. Para não só participaram ativamente da vida do clube como influenciarem, por exemplo, como olheiros do clube. Porque não? Quando não se sentiriam bem fazendo isso?

Fernando Schmidt diz que clube está se abrindo a uma maior participação do torcedor


Linha do tempo - Veja os principais atos dos 100 primeiros dias da Era Schmidt


Setembro

- Encontrados em sacos de lixo, troféus de 1959 e 1988 voltam ao Memorial do clube

- Pela primeira vez na história, uma reunião do Conselho Deliberativo é transmitida

- Ouvidoria online: pela 1ª vez, torcedores podem tirar dúvidas e ter respostas do clube em tempo real

- Fim de ingressos para torcidas organizadas

- Fim de custeio de viagem e hospedagem para membros da imprensa em jogos fora de casa

- Decreta-se tratamento igualitário para todos os veículos de comunicação

- Instalação da Central de Atendimento ao Sócio

- Sócios ganham desconto de 50% nos jogos na Fonte Nova

- Sócios herdam ingressos “das organizadas” em promoções nas redes sociais

- Bahia é o primeiro clube a manifestar apoio formal ao Bom Senso FC

- Em Brasília, Bahia se encontra com ministro do Esporte e vai à Caixa por patrocínio

- Clube promove as voltas da preliminar, do mascote e das crianças entrando com o time

- Bahia negocia redução de preços de ingressos com Fonte Nova e setor promocional fica lotado

Outubro

Fernando Schmidt vai à prefeitura discutir o Bahia

- Bahia vai à Prefeitura para resolver questão das Transcons da sede de praia

- Pela primeira vez, animadoras da torcida podem se apresentar dentro do gramado

- Souza é afastado do Ba-Vi e multado por conduta indevida

- Clube abre para torcedor mandar mensagens de incentivo para o Ba-Vi. Chegam quase 2 mil (188 páginas). Apoio é levado ao vestiário. Bahia vence o clássico

- Camisa da Democracia é lançada

- Gravação da campanha de sócio com artistas e jogadores

- Início das obras no alojamento da base, no Fazendão

- Pela primeira vez, sócios nos jogos fora de casa passam a ganhar ingressos da cota do clube

- Em Brasília, Bahia volta à Caixa e participa de evento na Câmara

- Time feminino é lançado

- Bahia cria o programa Padrinho Tricolor

- Clube convoca Embaixadas para recadastramento

- Provocado pelo Bahia, Ministério Público determina imediata investigação de ex-gestores do clube; procurador de Justiça vê “sérios indícios de condutas irregulares”

Novembro

- Bahia lança programa Esquadrãozinho para sócios mirins

- Preço do ingresso da Fonte Nova é reduzido, agora a partir de R$ 10

Busca por ingressos do Bahia em shopping atraiu uma multidão

- Bahia lança pacto de apoio para a reta final do Brasileirão, a campanha #TÔCONTIGOBAÊA, logo abraçada pela torcida.

- Promoção “Caça ao tesouro” faz sucesso na cidade. Ingressos “escondidos” em shopping acabam em poucas horas. Torcedores abrem caixa de incêndio e reviram lustres

- Promoção “ingresso-surpresa” presenteia torcedores que não conheciam a Fonte Nova.

- Nova lista de sócios é divulgada com 15.144 nomes. Número cresceu quase 600% desde julho. Bahia é o clube que mais subiu no período, junto com o Flamengo, segundo levantamento divulgado na última terça-feira pela Trevisan Escola de Negócios, em parceria com a Pluri Consultoria

- Ídolos do passado passam a poder entrar de graça nos jogos do Bahia

- Nova campanha “Você foi convocado para a batalha” também é destaque. Cartaz para jogo decisivo contra a Portuguesa aproveita comemoração de Fernandão contra o Náutico

- Time juvenil conquista primeiro título da gestão no Estadual da categoria sub-17, contra o Vitória

- Presidente vai à venda de ingressos para ouvir queixas dos torcedores

- Pela primeira vez, o clube homenageia as vítimas da tragédia da Fonte Nova, que completou seis anos no dia seguinte ao jogo Bahia x Portuguesa. Houve um minuto de silêncio e a equipe utilizou uma tarja preta no uniforme

- Bahia lança nova campanha de sócios com filme, peças publicitárias e anúncios em jornais e revistas

- Conselho Fiscal é eleito de maneira democrática pela primeira vez

Dezembro

Evaristo recebe de Fahel, Schmidt e Cristóvão camisa comemorativa

- Evaristo de Macedo é homenageado em visita ao Fazendão

- Sucesso na internet, irmã do zagueiro Demerson é trazida para o último jogo do ano e participa de ação para associação

- Despedida de 2013 tem associação em massa na arquibancada, homenagem ao atacante Fernandão e até rapel das Tricoleaders, exibindo faixas do Sócio do Bahia e exaltando a democracia no clube

- Contratações do novo técnico e do primeiro reforço são anunciadas via SMS para os sócios.

- Orçamento de 2014 é apresentado ao Conselho, que se reúne pela quinta vez em 3 meses; ambas as situações também são inéditas na história do clube

- Bahia convoca interessados a investir em fundo

- Clube passa a divulgar quem renunciou e quem assumiu cada um dos lugares no Conselho Deliberativo, além da lista dos suplentes, de documentos com as atas das reuniões e espaço para sugestões

- Clube lança aplicativo gratuito para tablets e celulares do sócio

- Camisa da Democracia "Série Ouro" é lançada com tiragem limitada


Fonte: Eric Luis Carvalho - GE.COM

Foto: Eric Luis Carvalho - Thiago Pereira e Divulgação/EC Bahia