Postado por - Newton Duarte

Inclusão social: Clubes do interior poderiam ajudar na ampliação de políticas sociais

Como o governo pode ampliar sua política social com os clubes do interior do Brasil

Crianças jogam futebol na favela do Salgueiro, no Rio de Janeiro (AP Photo/Natacha Pisarenko)

Quando se fala em renovação no futebol brasileiro, um dos pontos ressaltados por torcedores e analistas é a formação de jogadores. Há quem acredite que falta talento ao futebol brasileiro, mas não acreditamos que seja o caso. Mas para falarmos de categorias de base, é preciso olhar para um outro aspecto da formação. Os jogadores são, antes de tudo, pessoas. Cidadãos. Por isso, quando falamos das categorias de base, estamos falando também de uma questão social. Esporte é uma forma de inclusão social. Alguns clubes até se beneficiam dessa premissa para conseguir recursos do BNDES e reformar seus próprios Centros de Treinamento. Então, qual é o papel do governo nesse processo? Há pelo menos dois pontos importantes que vale a pena ressaltar. De um lado, o incentivo para que os clubes se mantenham vivos e mantenham a cultura de futebol ativas por todo Brasil. Por outro, atuar na área educacional, uma área que é responsabilidade dos governos de todos os níveis, federal, estadual e municipal. Por isso, resolvemos mostrar duas sugestões que podem reforçar uma das áreas onde o governo de Dilma Rousseff foi mais bem sucedido nos primeiros quatro anos: a inclusão social. O esporte pode ser ainda mais importante e, ao mesmo tempo, dar frutos que serão benéficos ao futebol brasileiro.

A Lei do Incentivo ao Esporte

É preciso entender primeiro que o esporte, para o governo, pode atuar em duas frentes importantes a longo prazo. A primeira delas é a saúde, fazendo com que o esporte seja parte da vida das crianças e, assim, crie a cultura da prática esportiva. Com isso, se economiza, porque os praticantes regulares de esportes tendem a ter menos problemas de saúde – afinal, como se sabe, o sedentarismo é uma das preocupações das organizações de saúde ao redor do mundo. Além, claro, da melhora de qualidade de vida que o esporte traz. Mas vai além disso: o esporte é uma forma de educação e de cultura.

“Segundo Oliveira e Paes (2004), em detrimento da competitividade, regras e regulamentos, os autores da pedagogia do esporte consideram importante os jogos desportivos coletivos para a educação de crianças e adolescentes de todos os segmentos da sociedade brasileira, pois sua prática pode suscitar aspectos de cooperatividade, convivência, participação, inclusão, entre outros”, diz artigo “O método de trabalho aplicado no processo de ensino do futebol”, de Anderson Mateus Viriato, na Universidade do Futebol.

Muitas das crianças se interessam naturalmente por futebol, o esporte mais popular do nosso país. Canalizar esse interesse e fazer com que a prática do esporte seja frequente acaba sendo uma vantagem. “O futebol tem forte presença no imaginário nacional, onde uma significativa parte dos meninos sonha em ser jogador de futebol e acompanham seus ídolos com atenção. Portanto os atores deste esporte têm a responsabilidade de procurar a melhoria constante de sua estrutura física, de seus profissionais e principalmente se fazer presente na atuação perante a sociedade da qual são parte integrante”, diz o artigo “A Lei de Incentivo ao Esporte e o desenvolvimento do futebol brasileiro”, de Fernando Luis Pereira e Carlos Antonio Borges Rizza, na Universidade do Futebol.

É nesse sentido que o governo pode atuar de forma incentivar a prática esportiva. E os clubes, já inseridos na cultura e dinâmica social das cidades pelo Brasil, podem ser agentes importantes. É por isso que clubes tem tentado usar essa lei para captar recursos e reformar ou construir seus centros de treinamento, como acontece com o Corinthians e como já foi com o São Paulo, anos atrás. Essa pode ser uma ferramenta inclusiva e de formação de jogadores. Mas Corinthians e São Paulo estão em um grande centro urbano e possuem muitos recursos. Podem, claro, se beneficiar da lei, que é para todos. Mas esse tipo de prática pode – e deve – ser concentrada em regiões do país onde há maior carência social e onde há menos estrutura para a prática esportiva.

“Os pequenos clubes de futebol do país praticamente acabaram com suas categorias de base por falta de recursos. Por outro lado, esses mesmos clubes são referências em seus municípios e despertam nas crianças e adolescentes o primeiro contato com o futebol profissional “in loco” e a vontade de tornar-se jogador de futebol”, descreve o artigo de Fernando Luis Pereira Lima e Carlos Rizza.

“Por intermédio da Lei de Incentivo ao Esporte, o clube pode, ao mesmo tempo, reativar suas categorias de base, com projetos sustentáveis, que proporcionarão o pagamento de recursos humanos (e sua capacitação), materiais esportivos, uniformes, equipes interdisciplinares compostas de médico, dentista, psicólogo, assistente social, fisiologista e nutricionista, e ainda auxiliar a comunidade na qual está inserido na erradicação do uso de drogas”, argumentam ainda os dois pesquisadores em seu texto.

O requisito para a participação nesse tipo de projeto, como é em vários outros programas sociais, é a comprovação de ser frequente na escola e possuir boas notas. “Em se tratando de futebol, a valorização das categorias de base dos clubes é de primordial importância, não só para revelar novos talentos para o Brasil, mas também para atuarem como pacificadores sociais nas comunidades que atuam”, diz ainda o artigo.

A escola também é fundamental

O papel de formadora através do esporte não pode ser exclusivamente dos clubes com suas categorias de base. Não só pela quantidade de clubes – não estão presente em número suficiente para atender toda a demanda que existe – como também há um problema de objetivos. O clube quer formar talentos para o alto rendimento e, portanto, incentiva um ambiente de competitividade muito além da questão social. E embora a competitividade seja proveitosa em certo aspecto, pode se tornar um problema quando é o foco. Por isso, é importante que o governo federal aja além dos clubes, com uma política integrada com governos estadual e municipal para atuar naquele que deve ser o ponto focal da educação, cultura e esporte para crianças: a escola. É na escola que o governo pode, e deve, promover uma cultura esportiva, com espaços democráticos para a prática do esporte.

“Almeida (1993) pondera que existe uma grande preocupação que é super valorização que o esporte competitivo vem adquirindo na sociedade moderna, devido a noção de sucesso que representa, não só a nível desportivo, como também, financeiro e social e político, tendo como uma das consequência mais marcante a iniciação precoce ao treinamento desportivo infantil”, diz o artigo de Viriato.

Com o futebol sendo inserido mais fortemente como desenvolvimento social, as escolas não só passam a ser também celeiros de formação de atletas, mas principalmente criam uma cultura esportiva nos cidadãos. Com o esporte mais inserido no cotidiano, não só a população teria benefícios de saúde e de formação social, mas também traria um maior entendimento do futebol como esporte. O esporte como algo democrático, participativo e lúdico, mais do que apenas competitivo.

Uma das plataformas do governo da presidente reeleita Dilma Rousseff foi o Pronatec – Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego. Esse programa tem como objetivo “ampliar a oferta de cursos de educação profissional e tecnológica”. Com a enorme necessidade de profissionais para trabalhar com as crianças em projetos esportivos, o governo federal pode direcionar recursos para a capacitação de pessoas para isso com o objetivo de criar centros esportivos pelo Brasil. E não precisa ser um novo centro esportivo, mas aproveitar – ou melhorar, quando possível – a estrutura das escolas, que já existem.

É preciso articulação com os governos locais, estaduais e municipais, mas é uma forma possível. É uma forma de fazer com que a própria comunidade tenha seus educadores, para não depender exclusivamente de profissionais de educação física, que podem atuar na coordenação desses projetos. Em um país com as dimensões do Brasil, a captação de talentos se aprimorará. Mais do que isso, a formação das pessoas será melhor, com valores que o esporte ensina. É possível. Mas é preciso trabalhar continuamente para isso. É o desafio que o governo terá para conseguir articular isso.