Postado por - Newton Duarte

Jornalismo Parça...

Jornalismo Parça


A reportagem do Esporte Espetacular, da Rede Globo, começou falando das amígdalas de Neymar. O médico explicou rapidamente os procedimentos da cirurgia. Enveredou para a expectativa que o maior jogador brasileiro da atualidade provoca entre os torcedores do Barcelona. Tudo natural, até então. Quando voltou para o estúdio, ressurgiu Glenda Kozlowski, sorridente, desejando toda a sorte do mundo e encerrando o programa com um abraço ao… “NEY”.

Sim, “Ney”, você não leu errado. É para corar diante de tamanho constrangimento. Glenda não é a única. É como o repórter que agradeceu (?) ao Alexandre Pato por voltar a jogar no Brasil. Ou o outro que vai até a casa dos jogadores para acordá-los com uma corneta. Uma série de jornalistas, apresentadores e afins busca constantemente, nessa era da espetacularização sobre o nada, exibir uma intimidade forçada, uma proximidade diante do protagonista que não existe. E mesmo que exista, não é papel do jornalista mostrar ao público o quão amigo é do entrevistado. Trata-se de um exibicionismo tolo, gratuito, irritante.

A impressão atual é que há uma subserviência ao tratarmos dos grandes nomes esportivos brasileiros e, por isso, o melhor caminho é trocar o jornalismo pela bajulação. E a nova geração de jogadores de futebol está cada vez mais acostumada a isso. Neilton, que alguns já se apressam a alçá-lo como o “novo Neymar”, teve suas redes sociais fuçadas para uma reportagem sobre a sua namorada. Isso tudo na véspera do jogo do Santos contra o Barcelona. Eis o jornalismo “parça”, que enaltece as conquistas amorosas de um boleiro com a mesma força que narra seus belos gols dentro de campo.

Não sou contra a informalidade, o humor e quadros de entretenimento quando o assunto principal é o esporte. Mas é necessário haver um equilíbrio para não cair no ridículo. Principalmente quando o veículo de comunicação é a TV, em que a luta pela audiência muitas vezes se transforma em um circo de bizarrices. As linhas editorias mudam constantemente, mas a identidade jornalística precisa ser preservada.

Não é “Ney”, é Neymar. Jornalista tratá-lo como um “parça” é a mesma coisa que repórter tentar ser amigo de uma fonte. Não costuma acabar bem. Depois, não há motivos para nos surpreendermos quando o jornalista é demitido e os animadores de auditório são mantidos para fechar as contas. Se o caminho definitivo a ser seguido é tratar o leitor, o ouvinte e o telespectador como idiotas, nunca estivemos tão próximos de atingir o destino.


O texto acima refere-se também ao texto abaixo


Neymar e a espetacularização do nada

Não era o homem pisando na Lua; era Neymar irrompendo o Camp Nou na apresentação oficial do Barcelona. Mas, para a imprensa brasileira, que nos últimos anos se dividiu em endeusar ou criticar severamente o jogador, era necessário ir além. Criou a editoria “Apresentação de Neymar”, em que cada detalhe ganhou uma comoção desmedida: a chegada ao aeroporto, a roupa do jogador, as Neymarzetes espanholas, as caras e bocas da namorada global, as imagens exclusivas do exame médico.

Os portais exibiram uma espécie de “tempo real” para cobrir o insignificante . Neymar almoçando na concentração, funcionários do estádio entregando copos de água aos torcedores, imagens incríveis do placar eletrônico. Em alguns momentos, parecia que estávamos diante de um conclave futebolístico. A cada minuto, uma atualização qualquer, desprovida de qualquer relevância.

Em um programa de TV, um debate acalorado sobre o número da camisa que usará o “astro brasileiro”. Só faltou consultarem um numerólogo para engrandecer a discussão. Em outro, o descritivo completo da primeira refeição de Neymar em Barcelona. Outro portal cobrava a participação das fãs no Twitter, pedindo a elas que registrassem em fotos a paixão pelo ídolo.

É possível notar ainda que a espetacularização não é exclusividade nossa. Os próprios veículos espanhóis exploraram a chegada de Neymar como o acontecimento do ano. Mas do lado de cá, a impressão é de que estamos apresentando para a Europa nossa melhor mercadoria, o menino dos gols de ouro, o jovem talento que precisou ultrapassar os limites sul-americanos. A imprensa brasileira adotou a postura de uma mãe orgulhosa, com lágrimas nos olhos, acompanhando os últimos passos do filhote sob a sua tutela.

Neymar não é só o maior jogador brasileiro da atualidade, mas também o de maior exposição e retorno publicitário. E a sua trajetória no Brasil muitas vezes se assemelhou a um comercial sem fim, sempre em busca do gol decisivo, do drible perfeito e do holofote mais bem posicionado. Agora, em solo europeu, surge a dúvida inevitável: será só mais um, ou o maior de todos? E aqui estaremos sedentos por curiosidades que virarão notícia. O que come por lá? Com quem divide o quarto na concentração? Como a namorada está se adaptando ao clima? Um boletim periódico sobre o nada. Um nada absoluto capaz de promover a paixão por algo que nem o torcedor sabe ao certo o que vem a ser.


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Fonte e imagens: Fabio Chiorino –Blog Esporte Fino – Carta Capital