Postado por - Newton Duarte

Nonato reencontra Fonte Nova e se declara ao Bahia

Nonato reencontra Fonte Nova e se declara ao Bahia: "Meu sonho é voltar"

Sétimo maior artilheiro do Tricolor baiano, atacante revelado no Fazendão vai pela primeira vez à nova arena e relembra histórias, como o mais belo gol da carreira

Passadas lentas e até meio "largadas", um físico não tão atlético como de costume entre os jogadores do futebol. No alto dos seus 1,76m, Raimundo Nonato de Lima Ribeiro chega à Fonte Nova como um filho que volta para casa anos depois. Com um personagem moldado naquele lugar e esperançoso por um reencontro: Nonato. Profissão: goleador. Aos 35 anos, os cabelos brancos são a principal diferença entre aquele jovem atacante que se profissionalizou e por seis temporadas vestiu a camisa do Bahia e o Nonato de hoje. Diferenças aqui e acolá, o rosto entrega a ansiedade. Os olhos parecem brilhar enquanto caminha pelos corredores do estádio. Passos à frente, elevadores, subidas, descidas, saída dos vestiários... Agora, sim. Olhos curiosos correm todo o estádio, aliados a um ar de emoção e satisfação. Um respiro prolongado, e Nonato se solta: está em casa.

Vestindo a camisa do Bahia, Nonato marcou 125 gols, a maioria deles ali na Fonte Nova. Sete anos depois de atuar na última e fatídica partida do antigo estádio, no dia 25 de novembro de 2007, quando sete pessoas morreram após desabamento de um pedaço da arquibancada, o atacante retorna ao lugar onde por tantas vezes foi feliz. E se rende ao novo estádio.

- É muito legal. Realmente, a Arena Fonte Nova ficou muito bonita. Depois de sete anos, retornando... Passa um filme na cabeça. As lembranças que tivemos aqui de alegria, uma de muita tristeza, quando a arquibancada da Fonte caiu, e tivemos aquela tragédia. São muitas recordações que você acaba revivendo e lembrando – conta sem esconder a emoção.  

Como um ser destinado a ser Bahia, Nonato encontra nos vestiários da Fonte Nova uma camisa do clube. Sem pensar duas vezes, veste. Como quem volta no tempo e revê as próprias glórias, o atacante sentencia a importância do Tricolor na sua vida.  

- O que o Bahia significa para mim? Tudo. O Bahia representa tudo. Eu virei jogador profissional aqui no Bahia. Foi o time que eu mais vesti a camisa. O time que mais joguei, o time onde eu fiz mais gols. Foi o time que me deu condições de viver uma vida tranquila hoje. Então o Bahia representa tudo para mim, e eu tenho um carinho muito grande pelo Bahia e principalmente com a torcida – diz.

“EU TENHO UM SONHO”  

Sete anos após sua segunda passagem pelo Bahia, Nonato tem nos cabelos brancos a indicação de que é um novo homem. Mais responsável, arrependido de momentos de indisciplina do passado, ele deixa transparecer em muitos momentos uma sensação de dualidade. Ora ainda é o tímido paraense que chegou jovem à Bahia para se tornar jogador, ora é ídolo de um dos maiores clubes do país que não tem rodeios para cavar um retorno.

- É um sonho. Quero voltar, até porque ainda tenho condições de jogar. Tenho 14 gols na temporada e, independente do campeonato que você dispute, o gol é sempre o gol. Acabei de ser artilheiro do Campeonato Goiano, que é muito competitivo, até mais do que o Campeonato Baiano. Você fazer gol em time grande é bem mais fácil, devido à condição técnica dos jogadores, que são de qualidade, mas em time pequeno é difícil. Você tem que torcer para receber uma bola e, quando tiver oportunidade, você tem que fazer. Ser artilheiro jogando em time pequeno, como fui agora, não é fácil. Por isso que eu continuo achando que eu tenho totais condições de voltar a vestir a camisa do Bahia, porque eu não vou ter dificuldades. É um clube com que sou totalmente identificado, não vou ter problemas de adaptação, porque é a camisa que eu mais vesti. A torcida já me conhece. Então eu tinha essa vontade. Mas é aquele negócio, não depende só da gente. Respeitamos pessoas que comandam o Bahia – revela ao GloboEsporte.com.

Após sete anos, Nonato reencontra o estádio da Fonte Nova (Foto: Egi Santana)

Mas Nonato sabe que seu sonho não passa apenas por seus próprios desejos. Para o atacante, o desejo da direção do clube, a permanência na Série A e até mesmo o seu passado de indisciplinas contam para uma nova chance.

- Vamos torcer para que dê tudo certo e que o Bahia siga na Primeira Divisão. Esse é o momento de torcer bastante, acreditar e incentivar, porque um time como o Bahia, além dessa torcida e a cidade de Salvador, não merecem uma time da tradição do Bahia numa Segunda Divisão. Tem que continuar na Primeira e brigando lá em cima. A gente fica triste de ver o Bahia brigando sempre para não cair. É uma situação complicada, até porque eu já passei por isso também, mas são grandes jogadores, que já jogam juntos há uns dois, três anos. É um momento de torcer para dar tudo certo – disse. 

Se continuasse naquele ritmo, nem futebol eu estava jogando mais.

Nonato

- Essas coisas que eu fiz no passado, marcaram muito negativamente minha carreira. Hoje todo mundo sabe do meu potencial e da capacidade que tenho, mas as pessoas querem saber como estou fora de campo. Hoje estou muito mais tranquilo. Se eu tivesse, naquela época, com o pensamento que tenho hoje, eu estaria, senão aqui no Bahia, em qualquer outro time tão grande quanto. Mas eu aprendi muito. Continuo jogando, fazendo meus gols, mas mudei bastante. Aquelas atitudes fizeram parte, porque eu era muito jovem e ganhei uma idolatria muito grande jogando aqui no maior clube do estado, jogando em Salvador e com muitos convites para festas, para as coisas, e você acabava indo. Mas, fora de campo, me atrapalhou bastante. Hoje, de repente, algumas pessoas do clube têm vontade de ter meu retorno, mas sempre têm certas restrições e opiniões diferentes, pelo fato de que as pessoas não sabem se minha vida fora de campo mudou, mas digo que minha vida mudou, porque continuo jogando e fazendo gols. Se continuasse naquele ritmo, nem futebol eu estava jogando mais. Hoje sou um cara mais tranquilo, mais consciente, extremamente família, e espero que as pessoas que estão vendo me deem uma nova oportunidade de voltar. O Bahia é um clube onde pretendo encerrar minha carreira, mas queria um pouco mais de tempo para jogar pelo menos mais uma temporada e depois um jogo de despedida – completa.

UM GOL PARA A ETERNIDADE

Nove de setembro de 2001. Estádio da Fonte Nova. Aos 9 minutos do segundo tempo, Nonato recebe na direita, dá um lençol no marcador e fz um dos mais belos gols da história da antiga Fonte Nova. Treze anos depois, o atacante não esquece aquele dia. Como se fosse ali naquele momento espectador de si mesmo, Nonato relembra da arquibancada aquele que define como o mais bonito gol da sua carreira.

- Ficou marcado. Com certeza, foi o gol mais bonito da minha carreira, sim. Hoje em dia, é difícil ver gols daquele estilo. Para mim, foi um gol marcante, um gol histórico, que as pessoas lembram até hoje. Foi um lance que começou com Bebeto Campos pela direita. Ele viu minha entrada na área. Quando ele lançou, o zagueiro, que era o Marcelo Djean, tentou antecipar o lance, eu acabei dando um biquinho na bola e colocando a bola por cima dele e, com um sem pulo muito bonito, terminei fazendo aquele gol mais bonito, e em cima de um grande goleiro que foi o Veloso, e que na antiga Fonte Nova foi um dos mais bonitos, senão o mais bonito que a antiga Fonte Nova já recebeu. Um gol marcante e histórico que as pessoas lembram até hoje com muito carinho – conta.

nonato bahia fonte nova (Foto: Egi Santana)

Da arquibancada atrás do "gol da Ladeira", Nonato relembra tento mais bonito da carreira (Foto: Egi Santana)

Quem viveu aquele dia não esquece. Muito menos o atacante. Em um dia de reencontros, lembranças e pedidos, Nonato deixa a Fonte Nova como quem deixa uma velha casa, agora reformado. Antes da partida, uma pergunta.

- Cabem quantas pessoas aqui? – diz o atacante acostumado a jogar para mais de 60 mil pessoas no antigo estádio.

Após ouvir a resposta, quase 50 mil, Nonato olha em direção às arquibancadas. A curiosidade e o sonho se misturam, e o atacante sorri timidamente, como se no fundo escutasse em coro o grito que lhe soava como música.

- Uh, terror! O Nonato é matador!  

Confira outros trechos da entrevista com Nonato ao GE.com  

No Bahia, você viveu muitos momentos, e não só de idolatria. Tiveram momentos de muitas críticas. Você acha que havia uma cobrança maior por você ter saído das divisões de base do clube?

- A cobrança é muito maior com jogadores do base. A torcida já me via nas preliminares, que aconteciam antigamente, dos campeonatos de base. A torcida me via fazendo muitos gols e me pedia para ir para o profissional. E em alguns momentos, teve a cobrança, mas faz parte. Tive personalidade, coragem, encarei as críticas de forma construtiva para mim e fui fazendo meus gols e minha parte dentro de campo. E hoje sou um cara por quem a torcida tem um carinho muito grande. Venho passar férias aqui, encontro com eles na rua, e as pessoas sempre pedindo para que eu retorne. Isso para mim é muito gratificante, mas a cobrança faz parte, principalmente com a garotada que vem da base, porque se cria uma expectativa muito grande nos times de baixo. E, quando chega no profissional, o torcedor quer ver o mesmo futebol ou até melhor, mas é ter persistência, coragem, personalidade e encarar com naturalidade. Tudo isso faz parte do mundo do futebol.  

Você tem muitos amigos feitos no Bahia? Dentro de campo, qual foi o seu maior parceiro?

- Tenho muitas amizades feitas no Bahia, alguns funcionários e jogadores da época que são daqui: Bebeto Campos, Cléber Carioca e outros que moram aqui em Salvador. Toda vez que venho, eu os encontro, e a gente se fala sempre, então eu tenho, graças a Deus, um ótimo relacionamento com todos. Nunca tive problemas com jogador nenhum, sempre me relacionei super bem com todos e tenho, graças a Deus, boas amizades por aqui. Agora dentro de campo, o melhor atacante com que, eu joguei aqui foi o Robson, o Robgol. Jogamos dois anos juntos (2001 e 2002), e foi uma parceria que marcou bastante também.

Problema de salário não é exclusivo do Bahia.

Nonato

Em 2002, você participou da campanha do Bahia no Campeonato Brasileiro, quando o time vivia uma situação parecida com a atual, com salários atrasados e iminência de rebaixamento. Mas não houve queda, por conta de uma vitória decisiva na última rodada. Problemas salariais podem ser decisivos para a situação dentro de campo?

- Esse problema de salário não é exclusivo do Bahia. É do futebol brasileiro. São poucos clubes que pagam em dia. Sempre tem, não é só o Bahia, mas quando você entra em campo você esquece, eu falo por mim. Eu esquecia os problemas, porque a cobrança é a mesma. O torcedor não quer saber se o salário está atrasado ou se está em dia. Ele quer ver seu time ganhar. Com esses jogadores não deve ser diferente. Todo mundo tem necessidade e compromisso, mas isso no momento que o Bahia está passando é o mínimo. Tem que continuar jogando para tirar o Bahia dessa situação e, depois, essa situação de salário sempre acaba resolvendo. Prioridade é livrar o Bahia dessa situação.

Esse ano, o Bahia promoveu da base o atacante Jeam, que ganhou o apelido de Nonatinho, por ter características semelhantes às suas. Como é que você vê uma homenagem como essa?

- Fiquei sabendo dessa situação. É legal esse carinho. As pessoas fazerem comparações. É sinal que eu fiz muitas coisas boas e muitos gols. É sempre bom o carinho do torcedor de uma forma ou de outra. Espero que o Jeam tenha uma carreira bonita como foi a minha no Bahia.