Postado por - Newton Duarte

O canal aberto que não consegue entrar nas operadoras de TVs fechadas

Esporte Interativo: o canal aberto que não consegue entrar nas operadoras de TVs fechadas

Um dos trunfos do Esporte Interativo é a final da Copa do Rei (Foto: AP)

Poucos imaginavam que o handebol tivesse tanto impacto. Sem espaço nas emissoras esportivas mais tradicionais, o Mundial da modalidade foi parar no Esporte Interativo. O canal mostrou, com exclusividade, a edição feminina do torneio em 2011. O Brasil fez boa campanha, mas nada que chamasse a atenção. O grande momento veio dois anos depois. A seleção foi dominante e arrancou até a decisão, contra a Sérvia. O interesse do público cresceu enormemente, mas… quem dependia dos pacotes de TV por assinatura não tinha como ver a conquista inédita das brasileiras. E a causa do EI, o canal de TV aberta que pouca gente tem acesso na fechada, ganhou grande repercussão.

O próprio Esporte Interativo levantou a pergunta em um anúncio na revista Veja, no final de 2013. ¨Por que os milhões de assinantes da Net e da Sky não conseguem assistir à programação do único canal esportivo de televisão aberta do Brasil?¨ Os motivos passam pelas negociações da remuneração das operadoras ao canal, os eventos oferecidos, o espaço disponível nessas operadoras e até questões políticas, alegadas pelo próprio canal.

É um universo delicado. Os canais trazem audiência e, claro, clientes às operadoras, mas a decisão final é delas. É preciso tato, pois uma pressão exagerada pode levar a uma repulsa. O EI não é muito discreto nas suas manifestações, mas evita dar nomes aos acusados. Nesse anúncio, a posição oficial do Esporte Interativo é que “as duas maiores operadoras do Brasil são vítimas do abuso de poder de uma programadora de canais, que pode vetar a distribuição de canais brasileiros”. Quem é a programadora? A emissora carioca não diz diretamente. Prefere dizer que há um consenso na sociedade. “O mercado inteiro está dizendo que essa programadora é a Globosat”, esquivou-se Edgar Diniz, presidente do EI, ao UOL.

Fontes independentes ouvidas pela Trivela concordam que o braço de TV paga da Globo é um fator que não pode ser desprezado. No entanto, há outras questões que devem ser consideradas. É o discurso da Net. “Trata-se de uma questão de custo-benefício. Um canal tem um custo, o dono dele quer vê-lo nas principais operadoras, que por sua vez têm de analisar se vale a pena repassá-lo, assim como os custos atrelados, ao assinante¨, comentou Fernando Magalhães, diretor de programação da operadora, à Folha de São Paulo. ¨Na época da entrada da Fox no Brasil, durante o período de negociação, alegaram a mesma coisa, que havia uma proibição. Hoje, faz parte dos nossos pacotes.”

De fato, a negociação canal-operadora é mais complexa do que pode parecer ao público. Não basta dois lados quererem. É preciso acertar vários detalhes, como espaço na grade (Há espaço para inserir um canal novo? Qual é esse espaço?), qualidade técnica (imagem, produção) e, principalmente, remuneração. Esse segundo ponto é o que causa mais conflitos.

Os canais recebem por cada assinante. O valor depende da relevância que o canal tem para o público e para a operadora. Há canais que não recebem nada. A maioria leva apenas alguns centavos por assinante. Os mais importantes (leia-se: os que motivam o público a pagar a mais) ganham a partir de R$ 1. Parece pouco, mas pode representar alguns milhões no faturamento anual.

A Trivela apurou que o Esporte Interativo está pedindo uma remuneração próxima à da Fox para entrar na Net e na Sky. O problema é que as TVs abertas normalmente não recebem das operadoras por já serem gratuitas. O EI não pretende se tornar um canal fechado, pois usa a condição de TV aberta para conseguir alguns direitos, como os da Liga dos Campeões e da NFL. A emissora alega que os valores que ela pede são proporcionais à audiência.

Um dos trunfos do Esporte Interativo é a final da Copa do Rei (Foto: AP)

Um dos trunfos do Esporte Interativo é a final da Copa do Rei

Mesmo longe das principais operadoras do Brasil, a emissora carioca teve momentos de grande repercussão. Ela foi a única a passar a final da Copa do Rei e, ano passado, mostrou com exclusividade o Mundial de Handebol. Tem também os direitos de eventos de outros esportes olímpicos, como taekwondo e judô. No entanto, falta aquela carta da manga, o campeonato que Net e Sky não podem deixar de transmitir (que no caso da Fox Sports foi a Libertadores).

“Nossa dificuldade é ser um canal jovem”, afirma o diretor de direitos Felipe Aquilino. “Às vezes a gente tem um pouco mais de dificuldade que outros canais para vender o EI, mas, por outro lado, temos uma audiência maior que outros canais de esporte. A gente conseguiu direitos interessantes pelo fato de ajudarmos a popularizar esses campeonatos, que aqui não são tão conhecidos”.

Ele colocou o Mundial de Handebol e o histórico com a Liga dos Campeões e com a Liga Europa como as principais vitórias nesses dez anos de existência. “Estamos indo muito com outros esportes, diferentes de outros canais. A gente olha para o perfil do nosso público. O futebol tem mais apelo que outros esportes olímpicos, mas estamos levando outros para a TV aberta com resultados relevantes”, completa.

O fator Nordeste

O Esporte Interativo tem os direitos de transmissão da Copa do Nordeste e de sete estaduais da região, menos Pernambuco e Bahia – no Ceará terá a partir de 2015. Todos esses campeonatos serão transmitidos no canal regional de TV paga, que entrou no ar em 4 de janeiro e também veicula programas específicos sobre o futebol nordestino. O planejamento prevê um investimento de R$ 100 milhões em dez anos e parcerias, como com o programa cearense Jangadeiro Esporte Clube.

A estratégia de fazer um canal regional é muito comum nos Estados Unidos. Cada grande cidade norte-americana tem uma ou duas emissoras esportivas locais, que transmitem os jogos dos times da cidade nas ligas de futebol americano, beisebol, basquete, hóquei, futebol e torneios universitários. A inspiração do EI tem sua razão de ser. Em junho do ano passado, a emissora anunciou uma parceria com a Turner, programadora do grupo americano Time Warner, que vai investir R$ 80 milhões no Esporte Interativo. E a escolha do Nordeste para essa aposta foi lógica. “É a região que mais cresce no País e ainda tem uma penetração de TV paga relativamente baixa. Olhamos para o mercado nordestino, que é super carente, e vimos ali uma oportunidade de lançar esse canal”, conta Aquilino.

O jornalista Erich Beting, especializado em negócios no esporte, considera esse um caminho interessante. ¨A identificação dos torcedores com o Nordeste é algo diferente em relação a outras regiões do país. E um canal que explora esse mercado, com potencial de crescimento, tem grande chance de dar certo”, diz. “Há uma demanda que não é cumprida. Estão sendo pioneiros. É uma boa chance de começar a ter maior crescimento do esporte no Nordeste, porque a mídia vai falar sobre ele, e com isso traz investimento.”

O Esporte Interativo ataca um problema específico da região Nordeste, que tem muitos times com torcidas relevantes. Mas deve ser uma iniciativa isolada, e não uma tendência de regionalização das emissoras. “Não consigo ver isso como uma questão”, explica Maurício Stycer, colunista de televisão do UOL. “No Nordeste há lugares com muito interesse e com times que não conseguem estar na elite, como Ceará, Rio Grande do Norte, às vezes Pernambuco e Bahia. Nesses lugares, é interessante, mas fora, isso, não vejo uma necessidade por esse tipo de cobertura.”

A presença do canal no Nordeste também fortalece os argumentos para convencer as operadoras. Quanto mais torcedores, assinantes e telespectadores querendo ver o Esporte Interativo, mais relevante o canal se torna e mais poder de barganha tem diante das operadoras. Mas a queda de braço continua, com pressão nem sempre velada e argumentos conflitantes dos dois lados.