A coletiva pós-jogo contra o Sport foi o ápice da irritação de Jorginho em sua curta passagem pelo Bahia. De saco cheio com as comparações com o seu antecessor, ele foi enfático: “Sou um treinador diferente do Guto, e o Guto não está mais aqui”. O Tricolor acabara de ser derrotado por 3 a 1, na Arena Fonte Nova, porém o que mais irritou não foi a derrota em si, mas a maneira como ela se deu, com a equipe letárgica em campo, sem brio e também sem recursos táticos para se impor sobre o rival pernambucano.
A comparação com Guto Ferreira chega a ser injusta, porém natural. Natural porque, quando deixou o Bahia rumo ao Internacional, Guto vivia o ápice do seu trabalho. Ele conhecia a característica do elenco que ajudou a montar, os jogadores haviam assimilado sua filosofia e a equipe, mesmo perdendo, encantava na Série A pelo bom futebol apresentado. Injusta porque Guto passou dez meses à frente do clube e, para quem não se lembra, o início da trajetória na Série B do ano passado não foi um mar de rosas (lembra da dificuldade para vencer fora de casa?).
Dois meses de trabalho, 14 jogos à frente do Bahia. É pouco tempo para plantar sementes e colher frutos do trabalho. Mas isso não livra o agora ex-técnico tricolor dos erros cometidos durante esse período. Quando se assume um clube de futebol no Brasil, geralmente as coisas não vão bem. Jorginho deu a sorte de receber uma equipe organizada e com algumas virtudes. Cabia, então, manter os pontos fortes e melhorar seus outros aspectos, de acordo com a sua própria filosofia de trabalho. Não foi isso que aconteceu.
Em prol de uma maior posse de bola, Jorginho “matou” as transições ofensivas em velocidade da equipe, característica marcante do fim da era Guto Ferreira. As aproximações e troca de posições entre os meias foram desaparecendo aos poucos, em que pese as alterações forçadas por lesões que o treinador precisou fazer. Por fim, embora não menos importante, o Bahia deixou de fazer a marcação alta que sufocava os adversários na Fonte Nova.
As relações extracampo também minaram o trabalho de Jorginho. Nos bastidores, sabe-se que alguns atletas estavam insatisfeitos com o treinador, e alguns sinais podem ser pescados, como a insatisfação de Régis ao ser substituído contra o Sport, ou alerta de Zé Rafael após a derrota para os pernambucanos: “Não sei se a gente está se expondo muito de maneira equivocada”.
O grupo também não recebeu bem as declarações de Jorginho após o empate em casa diante do Avaí, quando criticou a atuação dos três meias (Régis, Allione e Mendoza) na primeira etapa e disse que poderia ter substituído qualquer um deles. Régis e Allione nem voltaram do intervalo.
A diretoria tricolor enxergou o problema e quis cortar o mal pela raiz, sem dar muita bola para suas próprias convicções. A gestão de Marcelo Sant’Ana se apoia em discursos modernos, e certamente demitir um treinador com apenas dois meses de trabalho não é um dos itens da cartilha do presidente. Dois meses de trabalho ainda são dois meses de trabalho. É pouco tempo. Mas Jorginho abusou dos erros.
Fonte: Globo Esporte