Postado por - Newton Duarte

Revelando sonho inusitado, Bruno Paulista conta que pensou em desistir da carreira

Entrevista: Bruno Paulista conta que pensou em desistir da carreira e revela sonho inusitado

Atleta contou com o apoio do pai para superar dificuldades do futebol

Bruno Paulista chegou ao Bahia no fim de 2012, mas só estreou pelo time profissional do tricolor em agosto do ano passado. Em apenas seis meses, o menino nascido em Nova Odessa-SP conquistou a torcida com seu bom futebol e aceitou contar sua história.

Como começou essa sua vontade de ser jogador?

Gosto desde pequeno. Eu comecei a jogar bola com cinco anos, em uma escolinha perto de casa, no São José. Através dessa escolinha, fomos jogar um torneio que tinha São Paulo, Ponte Preta e São Caetano, e conseguimos ficar em terceiro lugar. Na partida do terceiro lugar, tinha um olheiro do São Paulo e ele me observou, disse que eu tinha qualidade e me chamou para fazer teste, mas eu não aceitei, porque estava começando, tinha só seis anos e não sabia nem o que era jogar futebol.

E quando você entendeu que queria isso como profissão?

Eu comecei a jogar bola mesmo quando meu pai me incentivou. Ele começou a falar: “filho, você vai consegui r e vai ser um grande jogador”. Quando eu tinha 12 anos, tive a chance de voltar para o São Paulo porque o treinador da época, Silva, me chamou e não esqueceu de mim. Comecei minha trajetória lá, mas não tinha como eu me alojar porque era muito pequeno e não tinha dinheiro. A gente morava longe, a umas 3 horas do centro de treinamento, e os treinos eram de segunda a quarta, então todos os dias meu pai se virava para conseguir nosso dinheiro da passagem. Ele tirava de todos os cantos, vendia coisa, até que ficou muito difícil. Eu treinava, chegava em casa, ainda ia para a escola depois, então era difícil para mim e para ele. Com essa rotina, ele acabou ficando endividado e eu falei: “pai, vamos parar. Vamos em busca de um time mais perto de casa”. Saí do São Paulo e fiz uma peneira no Santo André e fui levado para lá em 2011. Fiquei dois meses em fase de teste e comecei a ganhar uma ajuda de custo de R$ 150. Eu mandava R$ 100 para o meu pai e ficava com R$ 50 para alguns gastos pessoais. Pouco depois, fui dispensado e fiquei bem desanimado.

O que te deu força para não desistir?

Meu pai. Ele virou para mim e disse: “meu filho, se depender de mim, eu tiro a minha vida para que você seja um grande jogador de futebol. Você vai conseguir, mas tenha sempre respeito e humildade”. Não dava para desistir.

Nas viagens que faz com o Bahia, Bruno carrega a foto do pai no celular - (Foto: Arquivo Pessoal)

E como veio parar na Bahia?

Depois de ser dispensado do Santo André, consegui jogar aqui em Salvador, no Ypiranga, e acabei chegando ao Bahia. Treinei de domingo a domingo, em um sol muito forte, e acabei passando no teste. Comecei a ganhar um pouco melhor que no clube anterior e fiquei muito feliz, porque finalmente me senti podendo retribuir um pouco tudo o que meu pai fez por mim. Eu não tenho nem o que falar dele. Até hoje ele faz tudo por mim, me liga depois do jogo e chora. Eu tento ajudar ele, para ele fazer as coisinhas dele, mas ele não aceita. Ele não entende que o dinheiro é dele, que tudo o que eu consegui na vida foi por causa dele. Fico insistindo.

Já foi rejeitado em muitos times?

Já senti muito medo. Eu já fui reprovado em bastante time. Fiquei um ano no Corinthians e fui reprovado, também não me quiseram no Botafogo de Ribeirão Preto. Chegou uma hora que eu pensei em desistir e falei que nunca ia dar certo. Eu ficava vendo os jogos dos profissionais e pensava que não ia conseguir, até porque a idade ia passando, mas meu pai nunca me deixou desanimar e garantiu que eu chegaria lá. Cheguei.

Bruno Paulista agradece por momento que vive no Bahia - (Foto: Felipe Oliveira/EC Bahia/Divulgação)

Qual o momento mais difícil da sua carreira?

Na trajetória toda, a parte mais difícil foi quando meu pai ficou desempregado. Passamos bastante dificuldades. Eu mandava o que ganhava para que ele conseguisse se manter e hoje eu sinto uma alegria enorme de poder ver que não falta nada a ninguém lá em casa. Essa é a melhor parte de ser jogador. Poder ajudar, fazer por eles. Quero fazer muito mais.

Qual o maior sonho da sua vida?

O maior sonho é conseguir comprar uma casa para meu pai e ajudar meus tios, que também passam algumas dificuldades. Depois, a primeira coisa que eu quero fazer é abrir um canil. Eu adoro cachorro e dá muita pena ver os cachorrinhos na rua, com frio, pata quebrada. Por mim, eu levava todos para casa, mas moro em apartamento. Eu ia ser expulso rapidinho.

O futebol traz muito dinheiro e deslumbra muitos garotos que acabam se perdendo. É por isso que você sempre faz questão em falar de humildade?

Meu pai e meu empresário sempre falam isso para mim. Agora, recebendo um salários maior, é natural que a gente queira ter isso, ter aquilo, mas tem que haver controle e não se deixar levar. Eu nasci em uma família muito humilde e vou continuar nela. Dinheiro é bom? É. Mas não é tudo na vida. Tenho em primeiro lugar o meu caráter, respeito, humildade. E é isso que vai me fazer um grande homem, não o dinheiro que eu posso conseguir ter.

Você caiu nas graças da torcida muito rapidamente. Foi muito estranho no começo?

Nossa, no começo eu ficava com muita vergonha. Lembro que eu comecei a ir no shopping e as pessoas apontavam, falavam: “Olha, é o Bruno Paulista!”. Eu morria de vergonha, achava aquilo estranho, todo mundo olhando para mim. Sou muito tímido, eu brincava dizendo que ia sair correndo de lá. Mas já me acostumei e todo mundo que me para, eu atendo. Pode ser homem, mulher, loira, morena, ruiva, linda, horrível, não faz diferença. Todo mundo merece o meu respeito, acima de tudo.

Sua fase no Bahia é muito boa. Tem medo de ter uma má fase e não saber lidar com ela?

Hoje a torcida me aplaude, fala muita coisa legal de mim. Deus me livre passar por uma fase ruim ou jogar abaixo da média. Claro que tenho que ter tranquilidade para lidar, mas não quero passar por isso. Eu sei o quanto a torcida do Bahia é apaixonada e sabe que sempre podemos dar mais da gente. Se eu falhar, talvez peguem no pé, mas não vai ser má vontade. Vou me esforçar sempre ao máximo.

Como reage aos apelidos que a torcida botou em você?

É muito engraçado. Muitos me chamam de Bruno Kross, Schweinsteiger, Talisca depois do banho. É uma onda. Eu levo na brincadeira, lógico, porque não existe nenhuma comparação entre esses atletas e eu. Eles são atletas de alto nível e eu apenas sonho em chegar lá um dia.

Qual é o seu jogo inesquecível?

Foi a final do Campeonato Baiano sub-20, em 2014. Fomos campeões e pude jogar na presença da torcida pela primeira vez. Eu fiquei emocionado ao levantar a taça com a torcida. Foi a primeira vez que passei por isso. Espero conseguir isso pelo profissional. Esse ano tomara que seja tudo nosso.

Nada deles?

Nada deles! (risos).

Quem é seu maior ídolo?

CR7. Eu gosto muito de fazer brincadeira, mas Sérgio Soares briga comigo e me coloca na linha. Ele manda eu só brincar quando estiver em uma situação mais tranquila na competição. Eu vejo CR7 jogar e fico impressionado. Outro dia ele deu um elástico e o cara caiu no chão. Deu muita vontade de imitar, mas se eu perco a bola o Sérgio me mata (risos). Eu quero conseguir fazer essas coisas, mas acertando e com o estádio lotado. Já pensou? Deve ser muito bom (risos).

Sonha em jogar em algum time?

Meu maior sonho como profissional é poder jogar no Real Madrid, Barcelona ou Manchester United, que são os maiores times do mundo para mim. Eu fico impressionado vendo os caras jogando, acompanho desde pequeno. É o sonho da minha vida, ia ser a maior emoção do mundo. Espero que Deus me permita viver isso algum dia.

E no Brasil?

Não. Quando cheguei ao Bahia, eu avisei que queria ficar aqui e não tinha interesse em jogar em outro clube. Já existiu essa resenha de que o Cruzeiro queria e pedi ao empresário para fazer de tudo para não ir. Eu realmente quero ficar aqui, não tem motivo para sair.

Por que esse apego ao Bahia?

É onde eu quero fazer história. Porque foi o único clube que me abriu as portas e de uma forma muito rápida, que me surpreendeu. A torcida também me acolheu com um carinho impressionante, o elenco gosta de mim, a diretoria é muito correta comigo. A torcida do Bahia é muito apaixonada. Acho que é a que mais ama o time no Brasil. Não dá vontade nenhuma de sair daqui.

O que você sentiu no seu primeiro gol como profissional?

Nossa Senhora! Eu não sabia o que fazer. Naquele dia, minha namorada me pediu um gol e ela nunca havia pedido isso para mim. Eu prometi que ia tentar. Na hora, eu fiquei sem reação, saí correndo e só consegui me jogar nos braços das torcida. Depois que pensei: “putz, minha namorada!”. Saí correndo para dar entrevista e dediquei a ela.

E quando a carreira acabar?

Quero continuar no meio do futebol, que é tudo na minha vida.

Como técnico?

Talvez. Não entendo muito disso não, mas eu acho muito legal ficar observando, passando as dicas. Vou estudar para isso.