Postado por - Newton Duarte

#SonhoEmConstrução

"Pelo que o Bahia vem fazendo, a torcida tem que aumentar o sonho", avisa Cristóvão Borges

Em 11 jogos até aqui na Série A, são cinco vitórias, quatro empates e apenas duas derrotas. Resultado: o 3º lugar

Cristóvão Borges chegou ao Bahia justamente no início do Campeonato Brasileiro. Momento difícil, quando o tricolor enfrentava a fúria da torcida, engasgada com o título do rival Vitória com direito a duas goleadas históricas: 5x1 e 7x3. Aos 54 anos, esse soteropolitano criado no Nordeste de Amaralina fez mágica com o Esquadrão.

Em 11 jogos até aqui na Série A, são cinco vitórias, quatro empates e apenas duas derrotas, com 13 gols marcados e dez sofridos. O G-4 é uma realidade e, daqui pra frente, não custa nada sonhar. Depois da vitória por 3x0 sobre o Flamengo, o treinador visitou a redação do CORREIO e foi sabatinado pela equipe de Esporte. Sereno, Cristóvão não fugiu de nenhuma pergunta e mostrou o seu lado descontraído em boa parte das respostas. Confira a entrevista do técnico nesta e nas próximas páginas.

Direto ao assunto: O Bahia é o segundo no Brasileiro. O torcedor pode sonhar?

É interessante porque esse tipo de texto eu já usei algumas vezes conversando com os jogadores. Pelo que a gente vem fazendo, tem que aumentar o sonho. Tem que aumentar o sonho porque pode. Mas temos que ir passo a passo, aumentando a confiança. Uma coisa pode ter certeza: a gente vai fazer um bom campeonato.

É uma questão de confiança? Foi isso que você conseguiu resgatar?

Sim. Primeiro era sair daquele momento em que eles estavam muito tristes, confiança zero. Futebol é jogo de moral. Se você está com o moral elevado, o jogo flui e você faz coisas que nem acredita. Eles precisavam disso. Estavam muito sofridos. O primeiro trabalho era esse. Com isso, veio a nossa filosofia. Eu sou baiano, sou daqui e tem essa conversa (fora): ‘Ah, Nordeste, não sei o quê’. Saí daqui há muito tempo e consegui muita coisa porque sou confiante. Trabalhei muito isso também. Expus minhas ideias, eles acreditaram e se adaptaram ao trabalho. Quando faço uma palestra, falo tudo pra eles sobre organização tática. Mas tem que jogar. Se o time for só organizado não adianta nada. Tem que ser agressivo, atacar. Hoje eles não têm medo, receio ou dúvida. Pra ganhar da gente, vai ter que jogar melhor. Esse negócio de intimidar, não tem. Sei o quanto isso é importante. Hoje, posso dizer que isso está superado.

O que pôde ser feito no período da pausa para a Copa das Confederações?

Conversava com a comissão técnica do risco que estávamos correndo em jogar aqueles cinco jogos antes da Copa das Confederações. A gente trabalhou muito para tirar algum proveito daquilo. Sabíamos que o grande campeonato íamos jogar depois desse período. Mas a gente somou pontos surpreendentes, que ninguém imaginava... Todo mundo esperava só pancada. Foi o maior presente. O que o time faz de compactação, jogando em 40 metros, de se defender bem, ter jogo de transição... Tudo isso foi por causa desse período de treinamento.

Compactação, posse de bola e disciplina tática. Você sempre cita esse tripé nas entrevistas. É a base do seu trabalho?

Quando o Santos foi jogar com o Barcelona, todo mundo tomou um susto com o show. A gente já sabia daquilo tudo. Às vezes precisa acontecer uma tragédia ou ficar claro demais pra se ver aquilo. No Brasil, a gente precisa melhorar a organização de jogo, a posse de bola. Erra-se muito passe. Como se vai jogar futebol errando o tempo todo? No futebol europeu, existem poucos erros. Os caras tocam a bola e finalizam. A gente precisava evoluir na parte tática. Posicionamento em campo e disciplina. Ficam aí falando do Ganso. O cara é um fenômeno, mas futebol é competitivo. Tem que competir. Se não competir, não vai. Ao invés de ficarem cobrando os treinadores para que ele jogue, alguém poderia ir lá e dar um toque: ‘precisa melhorar nisso’.

Como implementar essa mentalidade com o jogador brasileiro?

Todos nós precisamos enxergar isso e valorizar. Falo muito do Ganso. Mesmo todo mundo vendo que ele é um craque, ficam forçando a barra ao invés de ajudar o cara a melhorar. O que acontece comigo? Você induz através de treinamentos específicos. Desde que cheguei aqui, recebi quatro propostas. Recebi propostas que financeiramente seriam altamente vantajosas. Não só financeiramente. Mas eu quero ficar. Estou conseguindo fazer aqui o trabalho que acredito, com a resposta que eu quero, que preciso como profissional.

Teve proposta do Fluminense?

Teve.

Então ninguém te tira do Bahia?

Aí eu não posso dizer. Pode vir um sheik aí (risos)...

Quando você saiu do Vasco, montou um grupo de estudos com a atual comissão técnica. Como foi isso?

A ideia foi minha. Trabalhei como assistente no Vasco. Quando você vive como assistente, naturalmente, fica mais próximo dos jogadores. Eu tinha isso. Minha relação com eles foi muito boa. Foi o meu trunfo. Quando saí de lá, fui fazer uma avaliação do que tinha vivido, do que tinha feito. Todo mundo falava muito bem desse período. Só que na avaliação que eu fiz, achei que podia mais, cabia mais, podia fazer melhor. Aí, eu fiz um grupo de estudo com a minha comissão que está comigo agora: Sebastião Rocha, Cristiano de Jesus e Rodrigo Poleto. Nós fomos estudar. Estudar o quê? Todo mundo que acompanha o futebol tem alguma crítica ao futebol que é jogado no Brasil. Claro que eu também tenho. O que acho que temos que evoluir em relação ao que se joga no mundo foi o que fui estudar. Fui estudar métodos de treinamentos, ver como os caras fazem. Não pra fazer igual, mas pra adaptar. Fizemos muitas pesquisas com livros, vídeos. Pra gente aperfeiçoar o nosso método de trabalho. Montamos o nosso método, que é o que a gente está colocando aqui. E a resposta é boa.

Como auxiliar, você tinha proximidade com os jogadores. Como se usa isso?

Isso me facilita bastante. Fui jogador, sei o que eles querem só de chegar, olhar. Sei a linguagem que eles entendem: objetiva, clara e direta.

Falando de jogador, Hélder é um dos que divide opiniões e oscila muito. Qual a sua opinião sobre ele?

Ele está há quatro anos aí e jogando... Mas tem uma coisa que fico impressionado desde que cheguei aqui. O que é essa coisa de três volantes? Rapaz, eu não tô acreditando nisso. Quero saber que trauma, que obsessão é essa? É muito emocional isso. Tem resultados positivos com três volantes, não tem? Falam mal geral!

É que o Bahia anteriormente era muito passivo com esse esquema...

E o Bahia de Cristóvão Borges? Continuam metendo pau porque coloco três volantes (risos). Nós estamos rindo, mas estou falando sério. Esse time que todo mundo está elogiando aí está com três volantes. Quando fiz diferente, ninguém falou nada. Todo mundo disse que eu era o melhor do mundo. Coloquei dois volantes contra o Goiás, fizemos dois gols e depois não tocamos mais na bola. Ninguém falou nada. O que eu tenho a ver com isso se os meus (volantes) estão jogando? E aí o cara vem ficar com esse trauma...

Você pode levar até 12 no banco, mas prefere usar menos. Por quê?

Não precisa levar tanta gente, pois senão vai confundir. Quando você vai no shopping comprar uma camisa, o cara vem com mais três e você fica na dúvida. Aí eu posso levar um monte pro banco, escolher errado e mudar errado. Tem que ser o dia a dia. Os caras que tô levando estão dando mais resposta do que os outros. Isso vai me garantir possibilidade menor de errar. Ítalo Melo, quando cheguei aqui, me impressionou. Joga pra caral...! Mas não está pronto ainda. Tecnicamente, joga pra caral... o moleque. Mas tem que amadurecer. Se colocar errado, vão acabar com ele. Os caras não estão vaiando o Talisca? Daqui a pouco o Bahia negocia o Talisca, ele vai embora e vai pra Seleção. Outro que tem que cuidar é o Madson. Não posso pegar um megafone e explicar pra torcida que eles oscilam.

Muita gente diz que Talisca é mascarado. Que cuidado que você toma com ele?

Cuido dele que nem cuido do meu filho. É um garoto simples. Tenho que cuidar dele porque senão daqui a pouco ele acredita naquelas vaias. Converso numa boa, como se fosse um amigo dele. O Bahia, talvez, não consiga contratar um jogador com esse talento. Se ele evoluir, vai dar um ganho para o clube muito grande. Ele recebe essas cargas e de vez em quando encolhe. É como acontece com Madson. Já falei pra ele: ‘Amigo, você escolheu isso, joga em time de massa, é pressão. Comece a aprender a se acostumar com isso. Eles não te vaiaram? Daqui a pouco vão te aplaudir’.

Qual a importância... (interrompido)

Desculpe, rapidinho. Falei pouco do Hélder. Quero falar dele. Se você fizer uma enquete com o treinador de qualquer time do Brasil, eu tô falando de qualquer um, qualquer time. Ele vai querer levar o Hélder. O Hélder é bom pra caral...! Jogador de alto nível. Eu só não posso perder o Hélder. Se eu perder o Hélder, não tenho substituição. Tenho pra quase todo mundo. Pra ele eu não tenho. Esse é o cara do meu time. Jogador do caral... esse cara.

Qual a importância de Fernandão?

Temos um time que defende bem e, por característica dos jogadores que tenho, joga sem um jogador específico para armar as jogadas. Não temos homem de ligação. Quando você não tem jogador de ligação, substitui por jogadas pelas laterais. Fernandão faz duas coisas: segura a bola na frente e o time faz a aproximação; e ele descansa o time. É um time que corre pra caramba. Isso a gente vê na fisiologia. E tem outra coisa. Aquele gol do Goiás é um gol avisado. O (segundo) do Marquinhos. Falei pra ele: ‘Vem cá. Você joga com um cara que ganha todas no alto e vai ficar esperando a bola antes dele? Se você sabe que ele vai ganhar, vai ficar esperando a bola? Porra, passa da bola que ele vai ganhar’. Ele fez o gol por causa disso.

Você falou que precisa arranjar outras formas de jogar. Já Caio Júnior elogiou a sequência da mesma escalação do Vitória. O que acha desses dois conceitos?

Uma coisa não desqualifica a outra. O que ele disse está correto. Só que Campeonato Brasileiro todo mundo vê todo mundo. Fui jogar contra ele e sabia tudo que o time dele ia fazer. Por isso cheguei lá e dificultei o time dele. Mesmo assim, o time dele faz muito bem aquilo ali, desde o início do ano. Tô buscando outras maneiras de jogar. Nós somos segundo na tabela. Todo mundo vai ficar vendo o Bahia. Tô vendo alternativas de jogo para um campeonato desse tamanho. Tem uma forma que tô morrendo de vontade e não consegui colocar ainda.

Sente falta de um clássico camisa 10?

Não. Para o que eu quero que o meu time faça, esse jogador não faz falta. Uma das coisas que eu achava que o futebol brasileiro precisava era aumentar a intensidade do jogo. Na concepção de jogo do meu time, esse jogador não cabe. Meu time tem que jogar com a intensidade lá em cima.

O Bahia precisa de reforços?

Precisa e estamos trabalhando pra isso. A gente precisa ter fôlego e eu quero respirar até o final do ano. A gente vai jogar a Sul-Americana também.

Já deu pra curtir Salvador?

Deu nada. Fico até com vergonha disso. Cheguei aqui e fui encontrar minha mãe pessoalmente quase um mês depois. Tava num hotel em Busca Vida, fui morar no Jardim de Alah. Minha mãe mora em Armação. Pedi mil desculpas. Ligava pra ela todo dia.

O Ba-Vi foi o momento da virada?

Foi o momento que confirmou. A vitória contra o Internacional no Sul é de tirar da cartola. A gente ganhou do Inter com autoridade. Fomos jogar com o Botafogo, campeão carioca, candidato ao título... Perdendo de 1x0 e viramos. O cara começa a acreditar. O Vitória estava engasgado, dava pra perceber neles.

Em relação à intervenção, como foi colocar na cabeça dos jogadores que eles estão defendendo a instituição Bahia?

Só vai atrapalhar se a gente ficar meses sem receber. Não tem acontecido isso. Um pequeno atraso não afeta em nada. O que eu quis que ficasse claro é que é um processo e não devemos ficar alheios a isso. Faz parte da nossa vida profissional. Só que aí eu deixei claro: ‘Saímos daquela merda, né? (derrotas no Baiano, Copa do Brasil e Copa do Nordeste). E a gente não quer voltar pra lá, né?’. Em que eu posso contribuir? Trabalhar, quero trabalhar. Tô vendo que a coisa tá andando, pronto. Nosso problema é o Campeonato Brasileiro.

Seu contato é só com Anderson Barros ou fala com Marcelo Filho também?

Falo pouco com ele. Antes disso já não falava muito. Não vou ficar falando com o presidente. Não é porque é aqui no Bahia, não. É em qualquer lugar. O presidente não está todo dia no clube. Com Anderson (Barros, diretor de futebol do clube) falo mais porque é diário. Antes da intervenção, falava com o presidente da mesma forma que falo agora.


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Fonte: Miro Palma –Correio*

Fotos: Robson Mendes – Correio*