Postado por - Newton Duarte

Verbas de TV, sexismo e Democracia: Partido político quer revolucionar futebol

Partido da Espanha quer transformar o futebol, começando pela distribuição da renda

Torcedor da Espanha (AP Photo/Daniel Ochoa de Olza)

O Podemos, partido de esquerda recentemente criado na Espanha, chegou no início de novembro ao topo da pesquisa de intenção de votos para as eleições gerais de 2015, desbancando os tradicionais PP (Partido Popular) e PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol). Calcado na insatisfação com o bipartidarismo e os casos de corrupção recentes no país, apresenta-se como terceira via e aposta nas bandeiras de participação popular e engajamento online e, com isso, aparece já com 27,7% da intenção de votos, segundo pesquisa encomendada pelo El País. Seu líder, Pablo Iglesias, fala em revolucionar a política espanhola, mas uma ala do partido tem também planos para o futebol. Chefe do Círculo Podemos Deporte, o jornalista Fonsi Loaiza, de 23 anos, contou ao Marca como pretende transformar o esporte na Espanha, deixando algumas lições para nós.

O que torna a pauta das propostas do Podemos para o futebol espanhol importante para nós, aqui do Brasil, é a intenção do partido de resolver problemas encontrados também em nosso futebol. Quando pensamos em problemas no Campeonato Espanhol, o primeiro que vem à mente é a distribuição desigual do dinheiro da TV entre os clubes. O Podemos quer mudar isso, dizendo ser contra a maneira como as coisas acontecem agora, propondo um modelo que fomente maior igualdade e sugerindo um teto salarial para que os mais ricos não se distanciem tanto dos mais pobres.

Ficando ainda na primeira divisão, o partido propõe a obrigatoriedade do estudo para atletas na elite do futebol espanhol. “Um jogador sem estudos não deveria jogar na primeira divisão. Isso deve ser uma mensagem à sociedade. O brasileiro Sócrates foi um bom exemplo e demonstrou que se pode conciliar o esporte e os estudos”, lembrou o jornalista. O Podemos também considera a interseção educação-esporte importante e acredita que o modelo norte-americano seja o melhor para promover a prática de atividades desde cedo.

O futebol brasileiro teve todos os seus problemas escancarados após a goleada sofrida para a Alemanha na Copa do Mundo. São tantas as coisas erradas que há bastante divergência sobre qual deveria ser o primeiro passo para que a bagunça seja arrumada, mas um elemento é compartilhado por muitos: a permanência de dirigentes de federações em seus cargos por décadas é uma das bases que sustenta um sistema tão falho como o que temos. Na Espanha, dadas as devidas proporções, isso também é um problema, e o Podemos pretende combatê-lo. “O esporte é a área aonde menos chegou democracia. Seguimos vendo dirigentes parasitas, no cargo há mais de 20 anos. E o pior é a falta de transparência”, comenta Loaiza.

O machismo institucionalizado no esporte também é alvo do partido, que, segundo o chefe do Círculo Podemos Deporte, pretende agir para dar mais respaldo dentro da Espanha a suas atletas, especialmente na formação. “As atletas estão abandonada e, apesar disso, ainda conseguem ter êxito. Não há uma explicação lógica, embora a realidade seja que elas tenham que sair da Espanha para poderem treinar e competir com os melhores. Não se pode aceitar que exista um decreto real que proíba as futebolistas de serem profissionais, quando as meninas se classificaram para o Mundial e conseguiram êxitos esportivos que os homens não conseguiram”, afirmou.

Até mesmo a seleção espanhola e a questão de identificação com a nação entrou em pauta nos tópicos apontados por Fonsi Loaiza. “Não concordamos com a obrigação de ter que ir com sua seleção, se por algum motivo você não se sente identificado. Tem que dar liberdade para os atletas que tenham nascido na Espanha para decidirem se querem ou não jogar na seleção. A jogadora de basquete Helena Boada sentia-se catalã e teve que se nacionalizar eslovena para não jogar pela Espanha. É uma questão de liberdade”, argumentou.

Como, exatamente, o Podemos pretende operar todas essas mudanças, caso chegue ao poder – ou mesmo aumentando gradativamente sua participação -, não sabemos, mas é interessante que todos esses assuntos, de alguma forma, sejam uma preocupação de uma força política crescente em um país de tradição forte no futebol. No melhor dos cenários, pode servir como exemplo não só para o Brasil, mas também para outros países que enfrentem problemas estruturais no esporte.